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Curadoria de artigos de UX, Visual e Product Design.

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A importância do feedback que você escolhe não falar

Fabricio Teixeira
UX Collective 🇧🇷
7 min readOct 21, 2019

Nos últimos tempos, tenho prestado muita atenção a um aspecto diferente do Design que não está relacionado ao craft: criar um ambiente seguro e colaborativo onde os designers podem performar o seu melhor.

Já ouvi e vi muitas histórias de designers talentosíssimos que se sentem frustrados por fatores externos que, no fim do dia, impedem que eles operem a 100% de sua capacidade. Esses fatores externos podem incluir muitas coisas: gerentes que não dão espaço para o designer crescer, colegas que não dão créditos aos outros por suas ideias, uma energia excessivamente competitiva no ambiente de trabalho, medo de receber feedback em público, síndrome do impostor, falta de clareza e direcionamento sobre próximos passos.

O que essas histórias têm em comum?

Designers que tiveram sua auto-confiança esmigalhada por um fator externo.

E se você trabalha nessa indústria há algum tempo, você sabe que designers que não estão com sua auto-confiança em dia certamente produzirão um trabalho com qualidade aquém de suas capacidades.

O elefante na sala

Reuniões de review de design são um momento crucial para qualquer designer. É o momento da verdade: eles estão se expondo, se colocando em uma posição de vulnerabilidade, compartilhando o resultado de seu trabalho e de seu pensamento, e sendo julgado tanto por habilidades técnicas (visual e craft) quanto por habilidades humanas (apresentação e lógica de raciocínio).

Por esses (e outros) motivos, estar na posição de diretor de design, diretor de criação, stakeholder, ou qualquer outra posição de liderança que envolva dar feedback sobre design, requer bastante empatia para com o designer que produziu aquele trabalho em primeiro lugar.

Por um lado, designers têm que se sentir confortáveis em receber feedback negativo, ter discussões acirradas sobre o trabalho, e entender que em nenhum momento aquelas discussões devem ser levadas para o lado pessoal ou ser interpretada como um questionamento sobre o talento do designer. Designers maduros sabem receber feedback sem interpretar aquilo como um insulto.

Por outro lado, sua posição de liderança não te dá liberdade de ser um “idiota” que desrespeita as outras pessoas.

Abaixo alguns princípios básicos que eu levo em conta toda vez que estou dando feedback para designers, sem machucar a moral do time ou destruir a confiança criativa do time no decorrer do processo.

Photo by Solal Ohayon

#1 Você não precisa apontar erros nos outros para defender sua ideia

Uma tática de negociação comum em várias indústrias quando você está tentando convencer as pessoas sobre algo, é atacar qualquer ideia que seja diferente da sua.

Não.

Vilanizar um design para poder derrubá-lo é infantil e só vai mostrar sua imaturidade para o restante do time. O simples conceito de que você precisa “destruir” uma ideia para conseguir vender outra é sinal que você criou um ambiente excessivamente competitivo em seu time. Ambientes tóxicos fazem as pessoas quererem sair.

Ao invés disso, você pode atingir o mesmo resultado focando nos pontos positivos da sua ideia preferida, sem precisar atacar nenhuma outra ideia ou pessoa que está ali na sala. Parece óbvio, mas não é todo mundo que tem a maturidade e a auto-consciência suficiente para conseguir controlar esse instinto.

#2 Você não precisa usar o seu discurso de feedback para provar para o time o quanto você sabe

Todos nós já vimos isso acontecer: um dos líderes usa aquele tempo do feedback para fazer uma verdadeira palestra sobre um assunto. A pessoa usa aquele tempo precioso para falar sobre seus vários anos de experiência trabalhando em certa indústria, sobre a quantidade infindável de conhecimento que possui em acessibilidade, sobre sua vasta experiência em desenhar experiências mobile, etc.

Líderes e diretores que vão por esse caminho geralmente sofrem de algum tipo de insegurança, ou estão tentando provar seu valor para aquele grupo de pessoas que estão na sala. O problema é: virar o holofote para si mesmo ao invés de focar no feedback faz o time perder preciosos minutos que poderiam estar sendo usados para deixar o trabalho melhor. Além disso, glorificar suas próprias habilidades pode fazer as pessoas ao seu redor se sentirem inseguras perto de você.

No fim do dia, toda discussão em um review de design deveria ser sobre como deixar o design mais forte e mais consistente. E não sobre o seu brilhante passado.

#3 Você precisa saber separar feedback conceitual de feedback tático

Primeira reunião do projeto. O time está apresentando pensamento high-level sobre conceitos para a experiência do produto. A reunião é mais sobre definir um framework estratégico para o produto, do que sobre discutir detalhes sobre a execução do produto.

Até que alguém vai lá e faz aquele comentário.

“Não sei… eu usaria sublinhado nos links, para deixar mais claro que o usuário pode clicar neles.”

“Não sei… acho que deveríamos ocultar o relógio do celular quando o usuário toca um vídeo em full screen.”

“Não sei não… não acho que o contraste aqui nessa tela passaria por um teste das guidelines AAA de acessibilidade.”

Jura?

Você realmente achou que a primeira semana do projeto era o momento certo de dar esse tipo de feedback?

Depois de anos trabalhando nessa indústria, diretores e líderes devem saber com clareza a diferença entre reviews de design conceitual versus reviews de design detalhado. O primeiro tipo é sobre explorar ideias, encorajar possibilidades, e expandir o pensamento o máximo possível. O segundo grupo é sobre refinar, tomar decisões, consertar problemas de usabilidade e deixar o design o mais detalhado o possível.

Quando você dá ao time feedback tático na fase conceitual do projeto, você não apenas está mostrando uma falha fundamental no seu entendimento do processo de design, mas também está ferindo a auto-confiança do time no trabalho que estão apresentando. Grandes líderes sabem a hora de empurrar o time adiante versus a hora de parar para consertar os detalhes.

#4 Você consegue atingir os mesmos resultados focando no que está funcionando do que apontando defeitos

Esse ponto é simples. Grandes líderes sabem como focar no lado positivo daquilo que estão vendo, destacando as partes que estão funcionando bem, celebrando os acertos do designer, e apontando o holofote para o tipo de solução que eles gostariam de ver com mais frequência naquele conceito/produto — ao invés de usar o review para apontar defeitos e reclamar sobre cada problema do design.

Existem exceções, no entanto. Na segunda ou terceira vez que o designer tenta uma ideia e ela continua não funcionando, é hora de ser um pouco mais direto no feedback para que o designer comece a pensar em outra solução.

#5 Feedback negativo é contagioso e afeta a moral do time

Todos nós já passamos por reuniões de review de design onde, depois de receber uma quantidade infindável de feedback sobre o trabalho, os designers se sentem completamente perdidos ao fim da reunião. Dá até para ver a nuvem escura no teto da sala.

O primeiro comentário negativo abre espaço para feedback negativo subsequente — mas o problema é que isso é contagioso. A última coisa que você quer enquanto líder de design é ver o seu time desmotivado e incapaz de seguir adiante com o trabalho.

#6 Certos comentários funcionam melhor em privado do que em público

Nem tudo precisa ser dito em voz alta no meio da reunião de design review, em frente a 12 pessoas. Certos tipos de feedback são tão táticos que funcionam melhor por outros canais.

Faça a conta: um erro de digitação, ou um problema simples de usabilidade é tão fácil de ser consertado, que não vale a pena gastar nem 1 minuto debatendo aquilo — especialmente 1 minuto de 12 pessoas.

Além disso, você não quer que o designer se sinta envergonhado por ter cometido aquele erro frente a um grande grupo de pessoas.

Uma mensagem no Slack depois da reunião dizendo que “oi, eu reparei em alguns erros de digitação na homepage que você mostrou hoje, posso te mandar?”, é uma maneira muito mais eficiente e gentil de resolver aquilo.

#7 No fim do dia, liderar é conseguir extrair o melhor de cada designer

A verdade é que somos todos humanos. Amamos o trabalho que fazemos, mas também queremos estar em um ambiente onde gostamos e respeitamos as pessoas com as quais trabalhamos. Gastamos longas horas do dia naquele ambiente — às vezes mais tempo do que conseguimos gastar com nossos familiares e amigos. Construir um ambiente onde as pessoas se sintam confortáveis, e um escritório onde as pessoas se empolguem em ir toda manhã vai não só aumentar a produtividade do seu time, mas também a qualidade do tempo que vocês passam juntos.

O feedback que você decide não falar é tão importante quanto o que você decide falar.

Este artigo é parte de Journey: lições aprendidas na incrível jornada de ser um designer.

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