Acessibilidade: como ficam os Testes de Usabilidades (por Ana Coli)

Paula Macedo
UX Collective 🇧🇷
3 min readJun 25, 2015

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Conversamos com as meninas da Saiba+ para saber um pouco mais da experiência delas com projetos acessíveis. Especialmente para a nossa série, a Ana Coli contou sobre um teste de usabilidade com pessoas com deficiências visuais e auditivas

Ana Coli

Por que vocês decidiram incluir participantes com deficiência visual/auditiva no teste? Partiu de vocês ou do cliente?

Na verdade, foi um teste exclusivo com participantes com deficiência visual ou auditiva, três de cada perfil. O cliente, um banco nacional, precisava verificar se seu site estava adequado para esses dois públicos.

O que essa inclusão significou do ponto de vista dos preparativos para o teste?

Foi bem diferente em vários aspectos.

Entre os deficientes visuais, um participante tinha baixa visão e usava um programa para ampliar a tela. Ele veio até nosso laboratório e precisava fazer pausas com frequência, pois ficava com a vista bastante cansada por ter que ficar bem próximo ao monitor.

No caso das outras duas participantes, que eram cegas, preferimos ir até suas casas, pois consideramos que o fato de usar um computador com a qual não estavam acostumadas (o da sala de testes) poderia influenciar o resultado da pesquisa, ainda que o leitor de telas fosse o mesmo.

Já para os deficiente auditivos, o recrutamento foi um processo complicado. A comunicação por e-mail foi difícil, pois vários deles têm o português como segunda língua (foram alfabetizados em libras) e não responderam nossas tentativas de comunicação. Por telefone, dependíamos de um intermediário e os parentes tendem a “proteger” os deficientes, recusando a participação deles nas entrevistas antes mesmo que conseguíssemos explicar do que se tratava.

Por fim, com a ajuda da intérprete que contratamos para os testes, conseguimos participantes no perfil da pesquisa. Para as entrevistas, perguntamos para os participantes se eles preferiam levar um intérprete ou se poderia ser a que contratamos; uma das entrevistadas levou a mãe, os outros optaram pela intérprete contratada.

E é muito diferente moderar com alguém “no meio”, traduzindo o que você fala: é preciso pedir para que essa pessoa seja o mais imparcial possível, traduzindo somente o que os dois lados (moderador e entrevistado) estão de fato dizendo.

E na hora do teste em si, qual tipo de feedback vocês receberam?

Em relação ao leitor de telas, por mais que você tente conhecer o programa, nada te prepara para o que você vai ouvir.

Os deficientes visuais usam o leitor numa velocidade impressionante: a gente não entende nada! Mas aí você vai pedindo para ele te explicar o que está acontecendo, ele vai navegando e mostrando se achou ou não o que você pediu, vai falando dos problemas e você vai se encontrando.

Sobre os deficientes auditivos, foram várias descobertas, por exemplo, não imaginávamos que alguns rótulos causariam tanta dificuldade: mesmo aqueles que são alfabetizados em português, acabam falando muitas vezes um português mais básico e então não entendem algumas palavras, precisam de ajuda com sinônimos.

Outro ponto: os sites produzem um vídeo, colocam legenda e acham que o problema está resolvido. Não está: além da legenda ser muito rápida para quem tem dificuldades com o português, muitas vezes as palavras não têm uma correspondência em libras. O ideal é mesmo ter uma tradução em libras.

Como essa inclusão afetou a análise final que vocês mandaram para o cliente?

Como esse teste era especificamente para esse público, o relatório teve esse foco.

Descobrimos com o teste que o site tinha vários problemas de programação que atrapalhavam o leitor de telas — coisas básicas, mas simples de resolver e que têm um impacto imenso na qualidade da navegação dos deficientes visuais.

A sensação que ficou para a gente é que com os deficientes auditivos é mais difícil: como trabalhar o conteúdo de um site de modo que ele seja inclusivo para esse público, sem deixar de lado o “tom” da comunicação da empresa?

As empresas devem se lembrar que deficientes visuais e auditivos também são consumidores de produtos e serviços: quem conseguir falar com esse público, entender e atender suas necessidades, vai se diferenciar e, com certeza, cativar um público que hoje é esquecido por quase todas as grandes marcas.

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15+y humanizing technologies. Senior Design Lead at Nubank empowering people and fighting against complexity in finance services *Personal opinion only*