Bibliografia brasileira sobre Experiência do Usuário
Algumas publicações e autores a partir dos anos 2000

A Experiência do Usuário, assim como o Design, é um conceito com diferentes significados (HASSENZAHL & TRACTINSKY, 2006). Dentre eles, está o significado de mercado e campo de atuação profissional, cuja ocupação na indústria de tecnologia demonstrou expressivo crescimento, especialmente na última década (NIELSEN, 2017).
Na busca por aperfeiçoamento profissional, as formações em cursos livres, mentorias e outras modalidades vêm crescendo entre iniciantes e quem está há mais tempo na estrada.
Nesse cenário, as fontes confiáveis de informação e conhecimento são cada vez mais importantes. A credibilidade e autoridade de quem produz o conhecimento é um fator indispensável em um mercado tão efervescente.
Por isso, ainda que vivamos em um momento no qual a informação esteja abundantemente disponível na web em uma cultura de convergência midiática (JENKINS, 2006), o desafio é saber selecionar o que é procedente e relevante. Nas palavras de Cortella e Dimenstein (2015), “o que importa é saber o que importa”.
Mesmo que ao longo da sua evolução a web tenha nos proporcionado diversos recursos de aprendizagem, o livro ainda é uma importante fonte de conhecimento sobre Experiência do Usuário na prática como designers de produtos digitais. Livros contêm um tipo de texto aprofundado, cuja seleção de tópicos provém de um olhar específico sobre um determinado tema. A leitura de um livro é como passar horas (e até temporadas) em diálogo com quem o escreveu.
É notório que a maior parte da literatura e de autores em Experiência do Usuário é de origem estrangeira, proveniente de pesquisadores e consultorias internacionais — sobretudo aquelas situadas em direção ao ártico. Podemos citar as obras do reputado canadense Jesse James Garrett, dos estadunidenses Louis Rosenfeld e Peter Morville e outros como Elizabeth Sanders, Jennifer Preece, Brenda Laurel, Donald Norman, Jakob Nielsen, Alan Cooper… a lista é quase interminável. Todos formam um panteão de autores do que podemos denominar escola norte-americana da Experiência do Usuário.¹
A importância das publicações nacionais
É inegável o benefício de estudar as formas como outras regiões do mundo exploram e entendem o assunto. Tal abordagem nos ajuda a entender o estado da arte sobre a área de estudo e desenvolver ações em linha com uma prática internacional comparada.
Todavia, a literatura nacional possibilita um olhar contextualizado e que agremia os diferentes matizes socioculturais e sociotécnicos que pertencem às formas de pensamento projetual do Design brasileiro. Assim, em vez de apenas importar, designers podem transportar em diferentes direções as óticas sobre a prática profissional.
Por meio do exercício de autoconhecimento pela literatura nacional, podemos ter em nossas mãos um prisma cujas facetas são os ângulos de uma paisagem mais próxima de nós. Isso pode orientar designers a analisar problemáticas e estabelecer comparações com outras realidades do mundo, nos habilitando a refletir, criticar e adaptar o conjunto de conceitos e métodos à realidade brasileira, inclusive produzindo os nossos próprios procedimentos.
Por falar nisso, existe um Design de Produto Digital à brasileira? De que forma designers resolvem problemas de Experiência do Usuário no Brasil? Quais conceitos sobre Experiência do Usuário são relevantes na visão nacional? Os nossos escritos e ideias verbalizadas podem nos ajudar a conhecer, comparar e refletir sobre o pensamento de designers do país.
Lista de livros brasileiros: um levantamento inicial
Listei alguns títulos brasileiros da literatura em Experiência do Usuário produzidos por praticantes e estudiosos da área, abrangendo o período de 2000 ao início de 2020. O levantamento considerou a verificação de currículos dos autores, que possuem entre 10 anos e 20 anos de atuação.
Cabe destacar que algumas obras possuem novas edições, porém optei por indicar o período da primeira publicação. Outra ressalva é que qualquer tentativa de narrar a história é sempre imbuída de um olhar subjetivo de quem a descreve (CARDOSO, 2008). Então, essa lista pode escapar a uma visão completa do acervo bibliográfico nacional. É, portanto, uma lista em construção.
A lista está ordenada a partir da publicação mais recente, dividida em literaturas técnica e acadêmica.
(No apêndice ao final deste artigo, organizei a lista em ordem alfabética)
Literatura técnica
Publicações de profissionais da indústria e especialistas na área, que pode abranger tanto conceitos como práticas da atividade profissional. Textos de opinião fundamentados em bibliografia ou apenas baseados em experiências autorais.















Literatura acadêmica
Publicações oriundas de pesquisadores e revisadas por pares da área científica (bancas de defesa ou comitê científico). Abrangem tanto questões teóricas como práticas. Textos necessariamente fundamentados em revisão bibliográfica.










Desdobramentos de uma bibliografia nacional para designers
Como é possível perceber, nosso acervo tem crescido nas últimas décadas e mais pessoas têm se disponibilizado a escrever e contribuir para a literatura nacional em Experiência do Usuário.
Uma a uma, cada publicação ajuda a consolidar um corpo de conhecimento nacional em teoria e prática de Design sobre o construto da Experiência do Usuário. Isso traz desdobramentos organizacionais, educacionais e socioculturais.
No contexto organizacional
Do ponto de vista organizacional e da inserção de designers nas empresas, ao conhecerem o pensamento brasileiro em Experiência do Usuário, designers podem aplicá-lo em seus contextos de trabalho, por meio dos aprendizados de outras pessoas que vivenciam o design de produtos digitais na realidade nacional. Isso possibilita validar ou aperfeiçoar práticas oriundas de outras partes do mundo, além de criar procedimentos nativos de nossa própria realidade de negócios. Essa dinâmica organizacional pode funcionar como a espiral do conhecimento proposta por Nonaka e Takeuchi (1995).

Na Educação em Design
Do ponto de vista da Educação em Design, olhar para a realidade cultural brasileira e aprender com ela para aprimorar a prática projetual é uma forma de educação para autonomia na formação de designers, na qual o aprendizado não se estabelece pela imposição do conhecimento como uma transferência bancária (FREIRE, 1996), mas pela mútua troca de saberes entre quem projeta e quem está na realidade do projeto.

Tal filosofia de design encontra eco no próprio conceito de Experiência do Usuário, o qual não deve reduzir o usuário ao nível pragmático e funcional, mas entendê-lo como indivíduo na sua dimensão semântica e subjetiva de seus itinerários de vida (GRILO, 2019; GRILO, 2017), elementos com os quais o designer pode aprender no processo de projeto. Os relatos de Sant’anna e Alves (2017) sobre experiências freireanas com professores e estudantes de Design apontam alguns caminhos:
A potência, para nós, reside então na problematização das tecnologias, na discussão crítica de seus impactos na vida dos usuários e dos projetistas que as adotam, na reflexão acerca das forças sociais que ajudam a perpetuar ou a transformar (SANT’ANNA e ALVES, 2017, p. 46).
Nas implicações socioculturais
Do ponto de vista sociocultural, pensar nas referências nacionais é uma forma de identidade não apenas com a língua vernácula, mas também com os contextos dos nossos diferentes Brasis: na economia, tecnologia, educação, cultura, ética e tudo que envolve projetar produtos digitais entre e para pessoas brasileiras. Outrossim, essa é uma escolha ética que visa contrapor formas de opressão social na interação humano-computador, disciplina que segundo Gonzatto e van Amstel (2022) traz em sua tradição uma visão hermética do usuário, a qual não explora aspectos humanos do usuário e tende a privilegiar quem projeta.
Sobre isso, gosto de fazer um trocadilho entre as palavras projeta e proteja, para refletir que, assim como a simples posição das letras, o posicionamento do designer é fundamental nos impactos da tecnologia.
Nesse movimento positivo para a profissão e para o ensino e pesquisa, trago algumas reflexões para uma agenda de produção bibliográfica sobre a área.
Uma agenda para a bibliografia brasileira em UX
Neste artigo, eu não propus analisar as obras e seus conteúdos, mas apresentar a consolidação de uma literatura nacional na área. Todavia, longe de apenas disseminar um panorama das obras — e mesmo considerando que este mapeamento é um recorte e que podem existir outras publicações —, algumas perguntas podem ser feitas sobre a literatura brasileira em Experiência do Usuário:
- Quais as temáticas abordadas? Quais ainda não são e poderiam ser?
- Quais são os grupos, segmentos e problemas da sociedade brasileira representados e contemplados nas publicações?
- Qual o perfil das pessoas que escrevem sobre Experiência do Usuário no Brasil? Nosso país é muito diverso. Reconhecendo isso, marcadores como cor, gênero, ocupação, região do país, dentre outras, são importantes para saber quem tem visibilidade e influência no debate intelectual sobre a área.
Essas questões são reflexões críticas (e também autocríticas para o caso dos autores, nos quais eu me incluo) que podem auxiliar em uma agenda de publicações em Design com foco em Experiência do Usuário no contexto brasileiro e em resposta à sua diversidade.
A propósito, se você já pensou em escrever um livro sobre a área, o contexto brasileiro é uma infinita fonte de inspiração. Nossa comunidade profissional precisa de gente somando com seus repertórios, perspectivas e vivências.

Como citei acima, esta é uma lista em construção.
Você conhece outras publicações brasileiras sobre Experiência do Usuário?
Referências
- CARDOSO, Rafael. Uma introdução à história do design. São Paulo: Blucher, 2008.
- CORTELLA, Mario Sergio; DIMENSTEIN, Gilberto. Era da curadoria. Papirus 7 Mares, 2015.
- FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
- HASSENZAHL, Marc; TRACTINSKY, Noam. User experience — a research agenda. Behaviour & Information Technology, v. 25, n. 2, 2006, pp. 91–97.
- JENKINS, Henry. Convergence Culture: Where Old and New Media Collide. New York University Press, 2006.
- GONZATTO, Rodrigo Freese; VAN AMSTEL, Frederick M.C. User oppression in human-computer interaction: a dialectical-existential perspective. Aslib Journal of Information Management, v. 74, n. 5, pp. 758–781.
- GRILO, André. Experiência do usuário em interfaces digitais: compreendendo o design nas tecnologias da informação. Sedis, 2019.
- GRILO, André. Understanding UX and UI in human-computer interaction: Some considerations in Interaction Design. 23 jul. 2017.
- NIELSEN, Jakob. A 100-Year View of User Experience. 24 dez. 2017.
- NONAKA, Ikujiro; TAKEUCHI, Hirotaka. The Knowledge-Creating Company: How Japanese Companies Create the Dynamics of Innovation. Oxford University Press, 1995.
- SANT’ANNA, Hugo Cristo; ALVES, Júlio César Reis. Incendiários: Paulo Freire e o Design de Interação. Edição dos autores, 2017.
Notas
- A Experiência do Usuário tem origens na Interação Humano-Computador, que veio a surgir como disciplina no contexto dos EUA, principal país a popularizar o computador pessoal no mundo, por meio de avanços de fabricantes como Xerox, Apple e Microsoft. Esse período reuniu nomes da Computação e da Ciência Cognitiva que deram base à literatura em UX. A IHC e depois a UX foram disciplinas que surgiram no contexto das demandas da Computação daquele país, daí a tradição dos textos estadunidenses em UX. No caso do Brasil, em que aspectos a bibliografia nacional pode ser protagonista para o mundo?
Apêndice: Bibliografia nacional em ordem alfabética
- AGNER, Luiz. Ergodesign e Arquitetura de Informação. Quartet, 2006.
- BARBOSA, Simone Diniz Junqueira; SILVA, Bruno Santana. Interação Humano-Computador. Elsevier, 2010.
- CYBIS, Walter, BETIOL, Adriana; FAUST, Richard. Ergonomia e usabilidade. Novatec, 2007.
- ESSER, Thiago. Design para a Experiência do Usuário: alguém está fazendo isso por você. Edição do autor, 2014.
- GRILO, André. Experiência do usuário em interfaces digitais: compreendendo o design nas tecnologias da informação. Sedis, 2019.
- GURGEL, Andrei. Codesigners: uma introdução à abordagem participativa e incremental do Design na criação e melhoria contínua de interfaces, produtos e serviços. Editora Viseu, 2022.
- HENRIQUES, Cecília; PILAR, Denise; IGNACIO, Elizete. UX Research com sotaque brasileiro. Edição das autoras, 2021.
- OLIVEIRA, Caio Cesar G. Vamos fazer Design de Interação? Edição do autor, 2013.
- OLIVEIRA, Josias. Design de Produto: Uma visão Product-Led sobre design de produtos digitais. Edição do autor, 2021.
- REIS, Guilhermo. Fundamentos de UX: conceitos e boas práticas. Edição do autor, 2022.
- ROCHA, Heloísa Vieira da; BARANAUSKAS, Maria Cecília Calani. Design e Avaliação de Interfaces Humano-Computador. Instituto de Computação, Unicamp, 2000.
- RODRIGUES, Bruno. Webwriting: pensando o texto para mídia digital. Editora Siciliano/Berkeley, 2000.
- RODRIGUES, Bruno. Webwriting: Redação & Informação para a web. Editora Brasport, 2006.
- RODRIGUES, Bruno. Webwriting: Redação para a mídia digital. Editora Atlas, 2014.
- RODRIGUES, Bruno. Em busca de boas práticas de UX Writing. Edição do autor, 2019.
- SANTA ROSA, José Guilherme; MORAES, Anamaria de. Avaliação e projeto no design de interfaces. 2AB, 2010.
- SANTA ROSA, José Guilherme; MORAES, Anamaria de. Design participativo. RioBooks, 2012.
- SANTA ROSA, José Guilherme; PEREIRA JUNIOR, Antônio; LAMEIRA, Allan Pablo. Neurodesign: O cérebro e a máquina. RioBooks, 2016.
- SANTA ROSA, José Guilherme. Teste De Usabilidade: Aprimorando A Experiência Do Usuário E A Interação Humano-computador. Editora 2AB, 2021.
- SOARES, Alex. Design com neurociências: Desvendando o comportamento humano para aprimorar seus projetos. Casa do Código, 2022.
- NZONGO, Filipe. Design em escala: projetando sistema de design consistente. Editora Viver Cultural, 2022.
- PEREIRA, Rogério. User Experience Design: Como criar produtos digitais com foco nas pessoas. Editora Casa do Código, 2018.
- PINHEIRO, Gabriel. UX estratégico: Design aplicado a ecossistema de produtos. Editora Casa do Código, 2021.
- TEIXEIRA, Fabrício. Introdução e Boas Práticas em UX Design. Editora Casa do Código, 2014.
- UNRUH, Gabriela Unger. Hune: Pesquisa em design e experiência do usuário. PUCPRESS, 2022.
