Como a Inteligência Artificial vai mudar o seu dia-a-dia de designer

Muito se fala em Inteligência Artificial, Machine Learning, e o uso de algoritmos ajudando a delinear o futuro do Design — e, consequentemente, o futuro da profissão de designer. Mas o que isso significa na prática?

Fabricio Teixeira
UX Collective 🇧🇷
9 min readAug 8, 2017

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O que não falta por aí são especialistas de robótica e inteligência artificial anunciando que o apocalipse está próximo. Não o apocalipse em si, no sentido bíblico, mas sim os robôs tomando uma fatia dos empregos hoje ocupados por humanos.

Um deles é o futurista Thomas Frey, que previu recentemente em um TEDx Talk que 2 bilhões de empregos vão ter desaparecido até 2030. Isso representa metade de todos os empregos do mundo.

Sim. Por causa de robôs.

Os carros auto-dirigíveis do Google e do Uber, os drones que entregam encomendas da Amazon, e os chatbots que substituem profissionais de call center são só o começo.

Mas e os designers? Será que nossa profissão também está correndo perigo? Como robôs, inteligência artificial e machine learning podem afetar nossas carreiras enquanto designers?

Os robôs não vão substituir os designers

Pelo menos não em um futuro próximo.

Você deve se lembrar do anúncio do The Grid há alguns anos: um sistema de desenvolvimento e construção de sites (a la Squarespace) movido por inteligência artificial — onde os módulos dos sites se desenham sozinhos, sem a necessidade de um designer.

Alguns meses depois surgem os primeiros sites criados pelo The Grid e eles são um desastre. “Seus empregos estão seguros, designers”, diz um dos comentários no reddit sobre o fiasco que foi a plataforma.

O fato é: a grande maioria desses 2 bilhões de empregos que serão desaparecerão por conta dos robôs são, inicialmente, os chamados “blue collar workers” (trabalhadores do colarinho azul?). Motoristas, entregadores, atendentes, escrivões, e outros cargos cujas tarefas são repetitivas e passíveis de automação.

Com Design, é um pouco mais complicado.

  • Você não decide se o menu do seu app vai ser exposto ou se vai ser um menu hamburguer baseado somente na quantidade de itens que ele possui.
  • Você não decide se vai criar um módulo de 3 colunas ou de 2 colunas no seu site baseado apenas no tamanho das imagens que possui.
  • Você não decide a cor da sua fonte baseado em alguma bíblia da “psicologia das cores” o tempo todo.

É mais provável que os robôs e os designers trabalhem lado a lado.

Ao invés de um problema, oportunidades.

Vamos a elas.

1. Treinar a inteligência artificial para automatizar atividades braçais

Uma parte do trabalho do designer, é sim braçal. Conversando com meu time, estimo que designers passem aproximadamente 20% do tempo resolvendo problemas que poderiam, sim, ser automatizados por robôs com inteligência artificial.

Recortar assets, cropar centenas de imagens, ou fazer algum tipo de color matching em fotos — esses são alguns exemplos de atividades que muitas vezes não conseguimos automatizar com uma simples “Ação” do Photoshop, porque requerem uma certa curadoria; um olho humano que tome decisões rápidas à medida em que esses processos ocorrem.

Mas e se pudéssemos “treinar” uma inteligência artificial para fazer isso pela gente?

E se a cropagem das fotos tivesse algum tipo de tecnologia de reconhecimento de imagem para garantir que o sujeito da foto nunca seja cropado por acidente? A Adobe já começou a brincar com essa tecnologia nas versões mais recentes do Photoshop, com seu context-aware crop:

E se o trabalho braçal de salvar uma mesma imagem em cinquenta idiomas diferentes pudesse acontecer em questão de segundos? É o que a Netflix começou a fazer em seu time de design, na hora de criar banners diferentes de uma mesma série ou filme em línguas diferentes; basta o designer olhar os layouts automaticamente gerados pelo robô e dizer se os aprovam ou reprovam.

Essas pequenas otimizações e automações permitirão que o designer libere mais tempo para pensar decisões estratégicas sobre o produto — aquelas que as máquinas levarão muitos, muitos mais anos para aprender.

2. Modularizar ainda mais o seu sistema de design

Inteligência Artificial pode deixar o seu sistema de design ainda mais poderoso. Para quem não está familiarizado com o termo, um Design System se trata de uma série de padrões, módulos e elementos que compõem uma linguagem de design de uma marca ou produto.

Grandes empresas estão confiando cada vez mais nos sistemas de design para manter seus produtos consistentes para o usuário: o Fluent, da Microsoft, o Material Design, do Google, o Harmony, da Intuit — só para citar alguns exemplos. Agora imagine que exista uma inteligência por trás desses sistemas que saiba analisar dados sobre a interação dos usuários com esses módulos em vários produtos diferentes, e entenda qual módulo funciona melhor para cada função. À medida em que essa inteligência aprende o que está funcionando e o que não está, ela pode começar a otimizar cada um desses módulos para que eles entreguem melhores resultados.

Ferramentas de construção de sites, como o Wix e o Squarespace, já começaram a incorporar algumas dessas tecnologias para ajudar o usuário a tomar micro-decisões de design. Ao contrário do pretensioso The Grid, que citamos no início do post, essas ferramentas estão incorporando AI de forma invisível, e para ajudar nas decisões de design secundárias.

Os sites não vão sair se desenhando sozinhos no curto prazo, mas podem sim exigir menos esforço de manutenção e otimização.

3. Criar estilos visuais generativos

Você já deve ter visto por aí aplicativos como o Artisto App, que aplicam filtros inteligentes a fotos e vídeos a partir de uma tecnologia de reconhecimento de imagem que identifica se aquilo ali na foto é um rosto ou uma torta de limão.

Existe toda uma geração de aplicativos como esse, baseados em tecnologias que conseguem criar estilos visuais dinâmicos e generativos.

Um outro exemplo de uso de AI (Artificial Intelligence) para criar elementos visuais automaticamente é o Auto Draw, um dos experimentos de AI do Google que “completa” automaticamente os seus sketches e os transformam em versões muito mais bem acabadas do que você seria capaz de fazer com o ponteiro do mouse em alguns segundos. Tudo isso porque, à medida em que mais pessoas utilizam a ferramenta, a tecnologia “aprende” o que os usuários estão tentando desenhar com certos traços.

Tecnologias como essa reduzem a barreira de entrada para que mais designer (e não-designers) consigam melhorar a qualidade e acabamento do que estão tentando produzir. Mais um exemplo da Inteligência Artificial sendo usada para assistir o designer, e não roubar seu emprego.

Existe toda uma geração de aplicativos como esse, baseados em tecnologias que conseguem criar estilos visuais dinâmicos e generativos.

Outro exemplo? Logos dinâmicos (como esse aqui da Oi), cujas variações de formato e cores e gradientes são todos gerados por um algoritmo.

4. Personalizar a experiência do usuário

Websites estão ficando cada vez mais inteligentes, e levando em conta vários fatores para criar uma experiência mais personalizada para o usuário: a hora do dia, o lugar de onde eles estão vindo, o tipo de dispositivo do qual estão acessando, o dia da semana — a lista é grande. A soma desses fatores todos pode dar ótimas dicas sobre o que o usuário está procurando ao chegar ali.

Mas até então, muitas dessas decisões sobre o que pode ser personalizado na experiência do usuário baseado nesses fatores eram feitas manualmente por designers ou estrategistas.

A partir do momento em que as máquinas começarem a tomar conta desse processo, as possibilidades de escalar os cenários de uso e passar a entregar hiper-personalização se tornarão muito mais viáveis. Mais personalização normalmente significa mais relevância, que leva a maiores taxas de conversão.

5. Análise de dados muito pesados

Existem cada vez mais sistemas por aí: sites, apps, serviços digitais. E cada vez mais usuários. Cada vez que um usuário interage com um desses serviços digitais, dados estão sendo gerados. Em abundância. O crescimento do mundo de analytics e business intelligence está só começando; análises de dados se tornarão cada vez mais complexas, com cruzamentos de dados cada vez mais refinados e valiosos para designers e product owners.

Em um futuro próximo, muito desse processo de coleta e análise de dados pode ser feita por inteligência artificial. Isso não significa que precisaremos de menos profissionais de analytics; mas sim que a mesma quantidade de profissionais conseguirão fazer análises muito mais refinadas e em profundidade sobre o comportamento do usuário com o produto.

E mais: processos com A/B testing podem acontecer sozinho, sem a necessidade de mediação humana. A inteligência artificial consegue:

  1. Identificar potenciais áreas e aspectos do produto que podem ser otimizados;
  2. Entender como essa otimização pode ocorrer (substituir uma palavra? trocar a cor de um botão? reposicionar um módulo da página?);
  3. Implementar a mudança e rodar o teste;
  4. Analisar o resultado, decidir qual das versões tem melhor performance;
  5. Atualizar o produto com a versão vencedora, e então recomeçar o ciclo.

Cada vez mais ouviremos falar de “sites que se otimizam sozinhos”.

6. Usar AI para melhorar a experiência do usuário

Essa categoria é a mais promissora de todas, e a menos explorada até então. Experiências “powered by Artificial Intelligence” estão apenas começando a surgir, e não vai levar muito tempo até os usuários se acostumarem que experiências inteligentes são a nova norma.

Alguns exemplos:

O Facebook utilizando AI para entender o conteúdo da imagem que você sobe. Duas aplicações práticas: assim o Facebook consegue “ler” o conteúdo da foto para usuários com dificuldades visuais que navegam utilizando leitores de tela; e sabendo o conteúdo das fotos que você sobe na rede social, o Facebook também consegue mostrar publicidade mais relevante para você (e cobrar mais caro dos anunciantes por isso).

O Google, que atualizou sua ferramenta Google Translate e incorporou elementos de inteligência artificial na forma como as frases são analizadas e traduzidas.

Recentemente, o Google também anunciou sua tecnologia de busca visual, o Google Lens — que também se utiliza de AI para reconhecer o conteúdo da câmera do usuário e mostrar conteúdos que sejam relevantes para ele.

Isso sem falar nos chatbots e assistentes virtuais, que estão ficando cada vez mais inteligentes e capazes de ter conversas mais naturais com os usuários. Isso significa que em breve você, designer, terá muito mais opções na hora de pensar os roteiros das conversas entre consumidor e robô.

Nenhum desses exemplos acima, como você deve ter reparado, “rouba” a profissão do designer. Pelo contrário. A tecnologia te ajuda a automatizar tarefas braçais, liberando seu tempo para a parte mais estratégica do design, e ainda te permite criar experiências do usuário que sejam mais personalizadas, relevantes, inteligentes e eficientes.

Cabe a nós começar a nos mover e identificar oportunidades de trabalharmos juntos com a tecnologia — nem para ela, nem com medo dela.

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