Como chegamos até a web3 e porque não tem mais volta
É hora de esquecer um pouco o preço do bitcoin e entender o potencial da tecnologia por trás dos criptoativos.
Muito tem se falado sobre criptoativos nos últimos anos. Em 2021, o Bitcoin e o Ether subiram 59,4% e 400,3%, respectivamente, chamando a atenção de muita gente. Sem falar em alguns NFTs que chegaram a ter uma valorização de 85.000% em dois meses.
Já em 2022, com a chegada de um bear market (período de queda nos preços dos ativos), no momento em que escrevo, o Bitcoin acumula uma queda de 67% no ano e o Ether 70%. Os badalados NFTs também registraram forte queda durante o ano.
Mas por trás dessas grandes oscilações nos criptoativos, que o mercado não cansa de comentar, existe uma tecnologia com grande poder disruptivo que vem dando vida a diversos projetos que agregam valor para a sociedade.
Neste artigo, eu pretendo te tirar um pouco do viés de investimento, e te apresentar um viés tecnológico, percorrendo os principais marcos da web, para que você entenda como chegamos até aqui, e porque não tem mais volta.
Primórdios da Web

O primeiro passo de descentralização ocorreu num contexto de guerra fria, quando os Estados Unidos criaram um sistema de descentralização de suas informações no Pentágono, para poderem ser acessadas remotamente, de modo que um possível ataque não causasse a perda irreparável de documentos do governo.
Posteriormente o sistema de comunicação entre computadores, foi além do ambiente militar e recebeu várias melhorias, como as padronizações TCP/IP, que possibilitou a criação da Nation Science Foundation Network em 1985. Uma grande rede entre universidades com foco em pesquisa e educação.
Nos anos 90 a internet passou também a ter fins comerciais, se tornou mais popular até que teve o seu boom nos anos 2000. A partir daí, até chegarmos na web3, dividimos a web em duas grandes fases: A web1.0 e a web 2.0
Web 1.0 (1995–2005)
A web 1.0 era composta majoritariamente por páginas estáticas. O usuário era apenas consumidor de conteúdo. Por meio de um computador em sua casa (client), o usuário se conectava a um servidor (server) e conseguia baixar informações para leitura.
Sites muito comuns dessa época eram bibliotecas, catálogos e páginas corporativas, nos quais todo o conteúdo é estático.

Nessa fase havia um profissional principal, responsável por diagramar este conteúdo para ser consumido: O web designer.
Web 2.0 (2005-Presente)
A web 2.0 é a que conhecemos atualmente (afinal a web3 ainda está nos seus primórdios), consiste em páginas dinâmicas, nas quais o usuário interage e cria conteúdo, ou seja, não só lê como também escreve informações no servidor.
Redes sociais, serviços de streaming, aplicativos de finanças, produtos SaaS (software as a service) de forma geral surgem nessa época.

Nessa fase, com grande preocupação em criar produtos multiplataformas (agora não é mais só no computador), fáceis de usar, com interfaces intuitivas, boa experiência de uso, e lucrativos; a área tech sofre grandes mudanças. Não existe mais um profissional principal responsável por isso. Existe uma equipe multidisciplinar composta por designers, engenheiros de software, gerentes de produto, cientistas de dados etc que tratam de fazer constantes interações para melhoria do que é entregue aos usuários.
Se a web 2.0 fez com que pensássemos em experiência, produtos bons e competitivos com foco no usuário, para que uma web3?
O fato é que esse modelo de interação no qual os usuários escrevem informações no servidor, criou uma valiosa base de dados para grandes empresas, que aliada a algoritmos sofisticados, podem até descobrir se uma pessoa está grávida antes mesmo de sua família.
Os principais problemas que a web 2.0 trouxe foi a falta de privacidade, a criação de monopólios e o poder concentrado em intermediadores, que gozando de posição favorável, podem ser menos flexíveis. Que artista promissor pode se dar ao luxo de abandonar o Spotify caso não concorde com suas políticas?

E se.. pudéssemos processar e armazenar dados no nível da rede, facilitando as interações entre participantes de forma eficiente, sem delegar o controle a uma autoridade central (sujeita a interesses próprios)?
Uma nova tecnologia chega na web
Foi com essa premissa que Satoshi Nakamoto publicou em 2008 o white paper chamado Bitcoin: A Peer-to-Peer Electronic Cash System. Com a criptomoeda Bitcoin, veio uma tecnologia de registro que era anônima, criptografada, segura, e validada por todos da rede. Essa tecnologia ficou conhecida como Blockchain.
Blockchain, como o nome sugere, são blocos ligados em cadeia. Cada bloco contém uma lista de transações e o hash do bloco anterior, de forma que para alterar o conteúdo de um bloco, você geraria um novo hash e teria que alterar todos os blocos na sequência, tornando a tarefa muito difícil para um hacker, e garantindo a segurança da rede.

Até que um grupo de pessoas se deu conta de que essa tecnologia poderia servir para além do registro de transações monetárias. Em 2014, Vitalik Buterin, com mais 6 pessoas, lançou a rede Ethereum, uma rede blockchain que também possui uma criptomoeda, o Ether, mas que consegue registrar aplicações completas, por meios de seus Smart Contracts (são programas que autoexecutam uma função caso determinada condição seja cumprida).

Com isso, surgiram as dApps (aplicações descentralizadas) que funcionam como uma interface mais amigável para que usuários consigam ver e registrar dados on chain, isto é, diretamente na rede, sem passar pelo provedor de serviço (intermediador). A blockchain funciona como um servidor descentralizado, e o provedor de serviço apenas consome os dados e entrega para que o usuário visualize na interface.
Outro tipo de token
Com a blockchain do Bitcoin, apenas era registrado valores da criptomoeda, um item fungível, isto é, pode ser substituído por outro de mesma natureza: um bitcoin vale o mesmo que outro bitcoin.
Entretanto, com a Ethereum e os Smart Contracts, surgiu um novo tipo de token, os não fungíveis, popularizados como NFTs (non fungible tokens).
NFTs
- Certificado digital único
- Registrado na blockchain
- Possibilidade de customização do contrato
- Aplicações variadas
Aqui eu apenas quero que você entenda que os NFTs não são apenas aquelas obra de artes de digitais que o jogador Neymar chegou a investir 6 milhões de reais, mas um sistema de registro de aplicações variadas.
Em abril desse ano fiz uma palestra na Semana de Design da UFF, e ao final dela eu distribuí NFTs para os que estavam presentes. Esses NFTs, em tese, não possuem valor comercial, apenas servem como certificado de presença do evento.
Se você quiser entender mais a fundo sobre outras aplicações dos NFTs, eu recomendo esse artigo do meu colega de profissão Icaro Ferracini.
Já não tem como voltar atrás
Essa nova era tem proporcionado algumas vantagens os usuários, que a meu ver, indicam que seja um avanço em definitivo.
Você dono dos seus itens
A web3 permite que você faça a custódia dos seus próprios ativos (sejam criptomoedas ou NFTs) em carteiras que apenas você tem a chave privada. Dessa forma, você não fica vulnerável às plataformas que fazem má gestão de seus ativos, vão à falência, e dão prejuízo aos seus usuários.
Se Vitalik Buterin uma vez chorou quando a Blizzard removeu um componente do seu personagem favorito no World of Warcraft, nos jogos construídos sobre a Web3, cada item adquirido é registrado permanentemente como NFT na posse do jogador, que inclusive pode ser vendido à outra pessoa, caso seja sua vontade.
Finanças Descentralizadas
Diversas aplicações financeiras foram criadas em cima da web3. Um exemplo que gosto é o Pool Together. Cada usuário trava uma certa quantia em staking (em poucas palavras, a renda fixa cripto), e renuncia a seus rendimentos individuais para ter a chance de levar o rendimento de toda a quantia travada no protocolo. Funciona como uma loteria sem perdas, se você não for sorteado não ganha nem perde nada. E claro, é tudo feito por meio de smart contracts, sem a necessidade de intermediadores, o que deixa mais barato e seguro.
Mais poder aos usuários
Lembra que comentei sobre o poder de monopólio do Spotify? Existe um projeto de streaming de áudio na blockchain, o Audius, que permite que cada artista configure sua monetização mediante smart contracts e emissão de tokens. Isso porque a plataforma não age como uma intermediadora do serviço, mas como um protocolo descentralizado gerido pela comunidade.
Serviços mais baratos
A Livepeer é um protocolo peer-to-peer (sem intermediários) para transcodificação de vídeos. Computadores ao redor do mundo podem executar seu código, emprestando seu poder de processamento de vídeo e sendo remunerados por isso. Para quem contrata o serviço, ela promete ser até 50x mais barata que a Google Cloud Platform ou a Amazon Web Service.
Desburocratização de sistemas tradicionais
Quem já comprou ou vendeu algum imóvel sabe o quão burocrático e demorado é. A netspaces está desburocratizando transações de imóveis por meio da criação de uma representação digital (via tokens) que garante aos seus detentores os direitos da propriedade representada (moradia ou recebimento de aluguéis).
Ainda é só o começo
Apesar de já haver várias iniciativas interessantes utilizando tecnologia blockchain, a tecnologia ainda é relativamente nova, pouco conhecida pela maioria das pessoas e ainda levará um tempo de maturação. Entretanto, ditas todas as suas vantagens e seu poder diruptivo, cada vez mais temos visto iniciativas de fomento desses projetos. Como exemplo temos a B3 e a Iporanga, que anunciaram fundos de venture capital para projetos web3.
E qual sua opinião? Também acredita que a web3 veio para ficar? Conhece algum outro projeto interessante que merece menção? Deixa aqui nos comentários para agregar na discussão :)
Referências
- Entendendo os NFTs: O que é isso e quais são suas aplicações?
- Internet completa 44 anos; relembre a história da web
- Web3
- Big Data: Como a Target descobriu uma gravidez antes da própria família?
- 35 Exemplos da Web 3.0 de Como a Blockchain Está Mudando a Internet
- Vitalik Buterin: The man who co-created Ethereum