Cultura de Design de Serviço e os rituais de DesignOps

Gus Correia
UX Collective 🇧🇷
6 min readNov 26, 2018

(Artigo produzido para e disponível originalmente no site da Livework)

TL;DR — O artigo em 30 segundos: Neste artigo, começo falando sobre o loop de criação de hábitos, segundo Charles Duhigg, o que pode ser particularmente útil para entendermos como finalmente podemos criar uma cultura de design e inovação de fato nas empresas. Na sequência, falo sobre alguns exemplos de rituais que, se implementados, ajudam a estabelecer uma REAL cultura de design — rituais de criação de empatia, de colaboração entre equipes e de experimentação. Ao final, levanto perguntas sobre quais seriam os possíveis gatilhos e recompensas que poderiam estar associados a estes rituais.

O que vemos para o futuro do Design Thinking

Desde sempre lidamos com projetos nos quais a demanda das empresas vai além de eventuais workshops e projetos isolados, indo na direção de "instalar" o Design de Serviço (ou Design Thinking per se) nas suas operações.

A intensificação desse tipo de demanda nos abre os olhos para toda uma dimensão nova do Design que pudesse nos responder como auxiliar as empresas nessa transição, particularmente na parte operacional — O DesignOps.

Ainda que o uso atual do termo que não traduza TODA a discussão sobre como escalar o Design de Serviço nas organizações (e é isso que estamos buscando agora) temos usado o DesignOps, até o momento, entendendo que levar ações tangíveis de design para o dia a dia pode conduzir a uma cultura baseada no design.

Há um tempo, escrevi sobre a necessidade de discutir DesignOps como um novo mindset de se implementar práticas de design no dia a dia, versus continuarmos com o hábito de conduzir uma variedade de workshops e design sprints nas empresas, sem grandes resultados palpáveis no longo prazo. Então, recomendo que você, se ainda não leu, dá uma passadinha lá antes de continuar por aqui :)

“Se a cultura está lá, o resto simplesmente funciona.”

Disse o Head de Design de um dos maiores marketplaces online do mundo e que precisa liderar equipes de Design e ProdDev em 45 países diferentes, ao ser perguntado sobre o maior conselho que ele daria pra quem está implantando suas estruturas de DesignOps.

Depois de atuar com mais de 200 empresas em projetos de CX, service design e desenvolvimento de times de inovação, nós na Livework apoiamos 100% esse tipo de afirmação. Frequentemente as pessoas subestimam a influência que a cultura na naquilo que as pessoas produzem, especialmente em relação a Design.

Acorde e Calce os Seus Sapatos de Corrida

Criar uma cultura é sobre a criação de hábitos. Uma interação frequente, redundante, num ritmo pedagógico e quase repetitivo, até que novas sinapses neurais tornem estes comportamentos algo automático. No caso de grupos (empresas), podemos falar que é necessário formar novas ‘sinapses culturais coletivas’ e isso é sim mais complexo, mas não menos possível por meio dos mesmos mecanismos.

Gatilho – Rotina – Recompensa

A ciência psicológica de se mudar um hábito consiste, basicamente, em se introduzir um novo "bom" hábito no lugar. E como criar novos hábitos? Segundo Charles Duhigg, autor do livro The Power of Habit: Why We Do What We Do in Life and Business, a formação de hábitos ocorre por um ciclo virtuoso que envolve executar uma ação (Gatilho) que te leva a executar uma Rotina e depois receber uma Recompensa por isso.

Se você quer criar um hábito de fazer exercícios todos os dias pela manhã, por exemplo, você poderia estabelecer um gatilho de colocar os seus tênis de corrida assim que você levantar da cama. E, após o exercício, se recompensar com aquela vitamina que tanto gosta. O gatilho serve para colocar o teu cérebro em modo "automático" o mais diretamente possível e a recompensa treina a sua mente que executar esta rotina pode lhe trazer satisfação.

Ciclo de criação de hábitos, segundo Charles Duhigg

“Nós somos o que repetidamente fazemos. Excelência, então, não é um feito. É um hábito. “ — Will Durant

Por que isso é importante para a implementação do Service Design em escala e dos processos de DesignOps? Porque ambos requerem a consolidação de uma cultura de Design nas empresas, e isso serve especialmente para os times de operações — desenvolvimento de produtos, atendimento ao cliente, vendas, TI, engenharia, etc.

E, pra que isso aconteça, precisamos definir quais rotinas exatamente gostaríamos de criar nas equipes e, na sequência, quais são os possíveis gatilhos que a precedem e talvez até as recompensas que possam ser dadas para estimular sua consolidação. Então…

…quais são os rituais de design que podemos implementar para a criar de uma legítima cultura de design (a.k.a Empatia + Colaboração + Experimentação)?

Rotinas de "Empatia"

Ter uma cultura de design significa empatizar com o universo dos seus clientes e entender suas jornadas antes, durante e depois do uso do seu serviço. Além disso, é imperativo tornar esse conhecimento algo comum nas discussões de todos. Ou seja, não é o bastante conduzir pesquisas esporádicas e, pior, deixá-las restritas às mãos de uns poucos pesquisadores ou designers. É importante disseminar esse conhecimento de maneira ampla a todos na organização.

Algumas rotinas que estimulam o senso de empatia do grupo:

  • Criação de grupos de usuários-chave e realização de entrevistas em pesquisas em profundidade e testes de protótipos de novos serviços;
  • Redesenho do formato de customer service, central de relacionamento, serviços de suporte, etc, com interações mais humanizadas e com escutas mais ativas dos usuários, além da integração dessas equipes com os times de desenvolvimento de serviço ao longo das etapas de criação, dando insights ou validando conceitos;
  • Implementar método de onboarding que envolva a alocação temporária (1 a 4 semanas) de novos colaboradores e assim que são admitidos, em funções de atendimento direto ao cliente para que cada novo colaborador tenha a visão mais próxima da realidade da prestação de serviço;
  • Criação interna de personas que retratam usuários "emblemáticos" do serviço e divulgação dessas personas pela companhia;
  • Mapeamento da Jornada dos Usuários, retratando o que ocorre antes, durante e depois da utilização dos serviços, na perspectiva desses usuários.

Rotinas de “Colaboração”

Colaborar é uma premissa num processo real de design. Seja colaboração com usuários, com especialistas, com pessoal de engenharia, de tecnologia, de comportamento, de pesquisa… enfim. Nesse sentido, é preciso que se habilite que estes processos colaborativos aconteçam.

“If everyone is moving forward together, then success takes care of itself.” — Henry Ford

Algumas rotinas que estimulam a colaboração entre as pessoas:

  • Criação de espaços de encontro diário e de trabalho entre as equipes (lounges comuns, salas de trabalho, mesas de reunião abertas, etc;
  • Criar momentos ritualísticos de encontro e trocas de experiências e compartilhamento de projetos em andamento entre as equipes (ex: dojos, daily stand ups, reuniões de retrospectiva, guildas, confrarias, etc);
  • Condução de rodadas de design critique onde os grupos se reúnem em dias predeterminados para apresentarem brevemente seus trabalhos e receberem feedback dos demais;
  • Desdobramento de “grandes” desafios de design em pequenos desafios de área, aproximando cada equipe das soluções que serão desenvolvidas;
  • Trabalhe com o RH para criar processos de 'mentoria cruzada' entre as pessoas de equipes diferentes, estimulando a conversa sobre projetos em andamento, boas práticas, etc.

Rotinas de “Experimentação”

"Prefiro 1 protótipo a 100 novas ideias", me disse certa vez o Head de Design e Inovação de uma empresa global de tecnologia. Ter múltiplas iterações é um fato consumado em qualquer processo de design, seja na arquitetura, no design gráfico, no design de interações e, claro, no design do serviço. Que tal abraçar esse fato e construir rituais que estimulam a experimentação?

"Design like you’re right, test like you’re wrong." — Colin McFarland

Algumas rotinas que estimulam a experimentação de novas soluções:

  • Recrutamento de beta testers (que podem ser ou não clientes da empresa) e condução periódica de experimentos com os protótipos;
  • Realização de mini concursos internos (com algum tipo de premiação) que estimulem a apresentação de protótipos das ideias para todos;
  • Realização sistemática de testes A/B, principalmente para soluções digitais;

Para pensar melhor…

Quais pequenas ações devem constar no dia a dia das pessoas e dos times, que os façam entrar em "modo design" de maneira automática?

Que tipo de incentivos (recompensas) imediatos podem estar atrelados de maneira direta à execução das rotinas com as que estão acima?

Written by Gus Correia

Innovation strategist and service design geek

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