Design Participativo: Uma abordagem colaborativa para o Design de Produtos

Incluindo usuários finais e equipe no processo criativo, mudando fundamentalmente a abordagem do design de produtos.

Mateus Germoglio
UX Collective 🇧🇷

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Duas pessoas trabalhando em frente a uma lousa, coberta por post-its coloridos. Na lousa, há um desenho de uma pessoa no centro, representando o usuário.
Achei tão bonitinho esse board ❤ Mas tenho que dizer que nem sempre ficam tão organizadinhos assim na vida real

Surgindo como uma reação às metodologias tradicionais, muitas vezes centradas na visão da empresa ou designer, o design participativo reconhece a importância de compreender as necessidades e perspectivas dos usuários desde as fases iniciais do desenvolvimento.

Essa abordagem colaborativa não apenas aumenta a probabilidade de criar produtos mais relevantes e eficazes, mas também promove um maior envolvimento e satisfação por parte dos usuários.

Contexto Histórico

A história do design participativo, também conhecido como design cooperativo, teve origem na Escandinávia e sua introdução nos Estados Unidos foi marcada por uma trajetória interessante.

Imagem linda de uma paisagem na Escandinávia, um vale com um lago no centro com dois navios de cruzeiro.
Jogando uma imagem da Escandinávia aqui, que lugar bonito né gente?

A ideia inicial do design participativo era envolver os trabalhadores, os famosos chão de fábrica, nas decisões sobre mudanças de processos e eficiência. Essa inclusão permitia que os trabalhadores compartilhassem suas perspectivas e contribuíssem com insights úteis para melhorar a eficiência e a qualidade dos processos. E fazer consequentemente com que as firmas lucrem mais :)

Inicialmente, o termo “cooperação” não ressoou bem nos Estados Unidos, devido à cultura da época (ah quem dera fosse só da época né?) que incentivava uma forte separação entre trabalhadores e gestores, que não estavam acostumados a discutir diretamente formas de trabalho diretamente com os funcionários. Por isso, o termo “participativo” foi adotado, refletindo a natureza das primeiras sessões que, embora não envolvessem uma cooperação direta entre os dois grupos, proporcionavam a participação de ambos no processo de design.

Essa mudança de termos pode parecer apenas uma questão de semântica, mas foi uma adaptação crucial para tornar o conceito mais palatável para os chefões da época.

Na Escandinávia, os projetos de pesquisa sobre a participação dos trabalhadores no desenvolvimento de sistemas e processos remontam à década de 1970. A chamada “abordagem de recursos coletivos” desenvolveu estratégias e técnicas para permitir que os trabalhadores influenciassem o design e a utilização de aplicações informáticas no local de trabalho. O projeto do Norwegian Iron and Metal Workers Union (NJMF) foi um dos primeiros a mudar o papel dos sindicatos no projeto, passando da pesquisa tradicional para trabalhar diretamente com as pessoas.

Mais uma vez os sindicatos ajudando o trabalhador! Quem diria hein?

Foto de um brasão antigo do Brasão da Norwegian Iron and Metal Workers Union.
Brasão da Norwegian Iron and Metal Workers Union

Qual a importância de trazer o usuário pro jogo?

O design participativo é considerado mais do que um processo; é uma filosofia que coloca os usuários finais no centro do processo de design (e, porque não, desenvolvimento).

Ao envolver os usuários desde o início, as empresas podem criar produtos que são mais relevantes, inovadores e satisfatórios para seus usuários. Além disso, o design participativo pode ajudar a reduzir os riscos e os custos associados ao desenvolvimento de produtos, ao garantir que o produto esteja alinhado com as necessidades e expectativas dos usuários finais.

Foto de uma pessoa segurando um cartaz com um mapa de empatia impresso.
O famoso mapa de empatia: Simplesmente meu framework favorito quando se trata de mapeamento de personas (imagem via Pinterest)

Mais alguns benefícios

  1. Empatia e compreensão: Ao conhecer profundamente as necessidades e contextos dos usuários, os designers podem criar soluções mais adequadas e relevantes. (Isso é crucial para garantir que as soluções resolvam realmente os problemas dos usuários, não apenas os que está na cabeça dos designers e stakeholders.)
  2. Relevância e adequação: Os usuários são os melhores especialistas em suas experiências, então incorporar seus insights garante que as soluções atendam às suas necessidades reais.
  3. Criatividade colaborativa: A colaboração com os usuários permite a co-criação de soluções mais originais e eficazes, ampliando a perspectiva e trazendo novas ideias.
  4. Propriedade e satisfação: Os usuários se sentem valorizados e têm um senso de propriedade em relação às soluções, aumentando a satisfação e a aceitação do produto final.
  5. Redução de riscos e custos: Identificar problemas cedo no processo reduz o risco de retrabalho e ajustes tardios, economizando tempo e recursos financeiros. (Essa é difícil para os stakeholders entenderem, corrigir problemas durante a fase de design é muito mais eficiente e econômico do que corrigi-los após a implementação.)
  6. Estreitamento de laços com os usuários: O feedback contínuo dos usuários permite a melhoria constante das soluções, adaptando-as às necessidades em constante evolução. (Os produtos devem evoluir com as necessidades dos usuários, e os pontos de contato contínuos garantem que isso aconteça.)

Trabalhar junto com os usuários é fundamental para criar produtos e serviços que agradem e sejam úteis de verdade. Além disso, essa abordagem ajuda a evitar problemas e economizar uma grana no desenvolvimento. (Diga isso para o seu stakeholder, às vezes funciona.)

Como e quando envolver os usuários e partes interessadas?

  1. Quando você quiser entender melhor como as pessoas pensam sobre um determinado problema, disciplina ou tecnologia, faça uma sessão de design participativo.
  2. Se você tem a sensação de que o que os usuários dizem que fazem e o que eles realmente fazem não é o mesmo, faça uma sessão de design participativo.
  3. Quando você sente que há, ou pode haver, qualquer desconexão cultural, social ou política entre você e o usuário final, faça uma sessão de design participativo.

Técnicas utilizadas

Existem várias técnicas comuns de design participativo fundamentais para envolver os usuários no processo de design. Essas técnicas permitem que os usuários expressem suas necessidades e desejos de forma eficaz, contribuindo para a criação de soluções mais centradas no usuário.

Duas fotos de boards com postits colados, esses postits foram utilizados em uma sessão de design participativo.
Normalmente os nossos boards se parecem mais com esses aqui. Como falei, sem muito glamour, mas com praticidade e muitos post-its! (Imagem via SheilaPontis)

O brainstorming, por exemplo, estimula a geração de ideias criativas e inovadoras, enquanto o shadowing possibilita uma compreensão mais profunda do usuário ao observar suas interações no ambiente real.

Abaixo incluí algumas técnicas que costumo utilizar nos meus discoveries, existem muuuiito mais técnicas disponíveis por aí, algumas até com o template pronto nas ferramentas, basta dar uma pesquisada e usar a criatividade.

  1. Entrevistas: Conversas individuais ou em grupo para entender as necessidades e expectativas dos usuários.
  2. Workshops de co-criação: Sessões colaborativas onde os usuários e a equipe de design trabalham juntos para gerar ideias e soluções.
  3. Jornadas do usuário: Mapeamento visual do processo que um usuário segue ao interagir com um produto ou serviço, identificando pontos de dor e oportunidades de melhoria.
  4. Prototipagem rápida: Criação rápida de versões simplificadas (no papel mesmo) do produto para validar ideias e obter feedback dos usuários.
  5. Testes de usabilidade: Observação dos usuários interagindo com o produto ou protótipo para identificar problemas de usabilidade.
  6. Storytelling: Uso de narrativas para comunicar ideias, cenários de uso e experiências desejadas.
  7. Brainstorming: Geração livre e rápida de ideias, sem julgamentos, para explorar diferentes abordagens e soluções.
  8. Crazy 8: Técnica de geração rápida de ideias onde os participantes criam oito soluções em oito minutos.
  9. Shadowing: Observação direta do usuário em seu ambiente natural para compreender melhor suas necessidades e comportamentos.
  10. Análise competitiva: Comparação com produtos ou serviços concorrentes para identificar pontos fortes e fracos e inspirar melhorias.

Ferramentas

Existem várias ferramentas disponíveis para ajudar no processo de design participativo, como softwares de prototipagem, questionários online e ferramentas de colaboração online. Essas ferramentas podem ajudar a facilitar a comunicação e a colaboração entre os membros da equipe de design e os usuários finais.

Um quadro dividido em duas partes: à esquerda, estão as ferramentas para sessões de design participativo online, e à direita, em caixa alta, está escrito ‘PAPEL E CANETA’, uma brincadeira, ou não.
Algumas ferramentas que você pode usar!

— Ai mas eu vou fazer um discovery presencial, não vou ter computadores disponíveis pra todo mundo.

— Não tem problema! Já ouviu falar em papel e caneta?

Às vezes é mais vantajoso a gente voltar para o básico e seguir com o bom e velho post-it, canetinhas coloridas e uma lousa branca. Junta todos em uma sala e arrasa na dinâmica.

Algumas ferramentas que você pode utilizar para sua sessão

  1. Miro: Uma plataforma online que permite a colaboração em tempo real, ideal para workshops de co-criação e mapeamento de jornadas. (Possui versão free com limitações)
  2. Zoom: Ferramenta de videoconferência que pode ser utilizada para realizar entrevistas com os usuários e workshops de design remotos. (Possui versão free com limitações)
  3. Google Forms: Útil para criar questionários e coletar feedback dos usuários de forma organizada. (Free)
  4. Figma/Figjam: Uma ferramenta de design colaborativo que permite a criação de protótipos interativos e o compartilhamento de designs com a equipe e os usuários para feedback. (Possui versão free com limitações que não atrapalham um uso casual)
  5. Mural: Plataforma digital para colaboração em equipe, ideal para sessões de brainstorming e organização de ideias. (Possui versão free com limitações)

Faça você mesmo! Não é tão difícil, eu juro!

Para fazer uma sessão de design participativo, é legal seguir algumas dicas. O lugar pode ser uma sala tranquila, com cadeiras confortáveis e sem muitas distrações. (Se tiver uma lousa, melhor ainda para anotar as ideias!

  1. Estreite os laços: Crie um ambiente seguro para seus usuários, onde eles se sintam à vontade para compartilhar suas opiniões e experiências sem medo de serem julgados ou sofrerem retaliação.
  2. Quebre o gelo: Comece a sessão com atividades para quebrar o gelo e ajudar os participantes a se sentirem mais relaxados e engajados.
  3. Seja claro e coeso: Explique o objetivo e os resultados desejados do exercício de design aos participantes.
  4. Facilite a sessão: Guie os participantes durante o exercício de design, incentivando a colaboração e o foco na tarefa.
  5. Incentive a reflexão e o feedback: Após o exercício de design, incentive os participantes a refletir sobre sua experiência e compartilhar suas ideias.
  6. Documente e analise os resultados: Capture os resultados da sessão, registrando notas e coletando artefatos produzidos durante o exercício. (Observação: tudo que for coletado durante uma sessão deve ser consentido pelos participantes, não vai sair gravando a voz do povo por aí!)
  7. Acompanhamento com os participantes: Faça o acompanhamento com os participantes para agradecê-los por suas contribuições.

Em suma, o design participativo representa uma abordagem transformadora no desenvolvimento de produtos, ao integrar ativamente os usuários e partes interessadas no processo criativo. Ao contrário das metodologias tradicionais, que frequentemente negligenciam as perspectivas dos usuários finais, o design participativo reconhece a importância de envolvê-los desde as fases iniciais do projeto.

Isso não apenas aumenta a probabilidade de criar produtos mais relevantes e eficazes, mas também promove um maior envolvimento e satisfação por parte dos usuários. A abordagem colaborativa do design participativo não apenas promove a inovação, mas também fortalece os laços entre a empresa e seus clientes, resultando em produtos mais alinhados com as necessidades reais do mercado.

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Cria da Manguetown, especialista em UX, Designer Sênior e Writer no UX Collective 🇧🇷