Designer de Dribbble vs. Designer do Mundo Real

Fabricio Teixeira
UX Collective đŸ‡§đŸ‡·
4 min readOct 1, 2015

--

Aqui nos EUA Ă© muito comum que designers recĂ©m-formados utilizem plataformas como o Dribbble ou o Behance para demonstrarem algumas de suas habilidades em design digital. Pixels arranjados em estado de arte, boards lindĂ­ssimos com o famoso “pixel-perfect design”, onde o acabamento visual da interface impressiona atĂ© os designers mais experientes no mercado.

O outro lado da moeda

Por mais que sites como Dribbble e Behance sejam Ăłtimas plataformas para mostrar o trabalho de user interface designers, eles deixam de mostrar um dos pontos mais importantes do processo de design: os porquĂȘs das decisĂ”es terem sido tomadas daquela forma e do produto final ter aquela aparĂȘncia, hierarquia, arquitetura de informação e conteĂșdo.

Projetos do dia-a-dia costumam esbarrar em problemas que os projetos do Dribbble quase nunca enfrentam:

  • ConteĂșdo real criado por terceiros ou pelo cliente;
  • Excesso de funcionalidades em um Ășnico produto;
  • LimitaçÔes tecnolĂłgicas da plataforma em que o produto estĂĄ sendo desenvolvido;
  • DecisĂ”es de negĂłcios que impactam o resultado final da interface;
  • LimitaçÔes de escopo ou budget;
  • As necessidades dos usuĂĄrios reais do produto;
  • Entre outros.
Interface publicada no Dribbble

SerĂĄ que os grĂĄficos acima vĂŁo ficar tĂŁo bonitos quando os dados reais que vĂȘem do back-end forem integrados ao sistema?

DaĂ­ a expressĂŁo “Designer de Dribble”. O fulano que possui Ăłtimas habilidades no Photoshop ou no Sketch — mas que possui quase nula experiĂȘncia em enfrentar os desafios que os projetos “do mundo real” trazem todos os dias.

O KPI dos designs de Dribbble sĂŁo diferentes dos KPIs do mundo real

KPI significa Key Performance Indicator. SĂŁo as mĂ©tricas que indicarĂŁo se um produto teve sucesso ou nĂŁo. Em produtos reais, geralmente o time estĂĄ desenhando o produto com alguns objetivos de negĂłcios em mente. Por exemplo, o KPI de um formulĂĄrio de cadastro Ă©, obviamente, o nĂșmero de usuĂĄrios que conseguem completar o cadastro. Um formulĂĄrio de sucesso Ă© aquele onde a porcentagem de abandono Ă© relativamente baixa — o que pode ser um indicativo de boa usabilidade, clareza, relevĂąncia e suporte de qualidade ao usuĂĄrio que estĂĄ tentando completar aquela tarefa.

JĂĄ no Dribbble, os designs sĂŁo feitos com outros KPIs em mente. O designer que publica seu trabalho na plataforma estĂĄ interessado em Likes, Pageviews, ou em comentĂĄrios de outros designers dizendo que “isso Ă© gĂȘnio!” ou que “interface linda, parabĂ©ns!”. Tudo Ă© feito para mostrar as habilidades e o bom gosto visual do designer — e nĂŁo para resolver um problema real dos usuĂĄrios ou um objetivo de negĂłcios do cliente.

O que plataformas como essa acabam fazendo Ă© recompensar trabalhos que, por mais lindos que sejam, focam na superficialidade da Ășltima camada possĂ­vel do processo de design: os pixels.

“O portfolio dele Ă© lindĂ­ssimo, mas eu tenho medo de ele ser sĂł um desses ‘designers de dribbble’, sabe?”

A dificuldade de contratar designers do mundo real

Outro dia alguém do meu time entrevistou um potencial candidato para uma vaga de Designer de Interfaces, e no final da entrevista eu perguntei para essa pessoa o que ela achou do candidato.

– O portfolio dele Ă© lindĂ­ssimo, mas eu tenho medo de ele ser sĂł um desses “designers de dribbble”, sabe? Quando comecei a fazer perguntas sobre o porquĂȘ dele ter tomado certas decisĂ”es naquele layout, as respostas foram sempre direcionadas a estĂ©tica, e nunca a um problema real que ele estava tentando resolver.

É um bom ponto.

Quando designers se juntam a times que estão criando produtos reais, as preocupaçÔes passam a ser outras. Ou melhor: as preocupaçÔes PRECISAM passar a ser outras. Um designer que desconsidera as limitaçÔes tecnológicas da plataforma que estå sendo usada para desenvolver o produto, por exemplo, pode acabar trazendo mais dores de cabeça do que progresso para o caminhar do projeto.

Identificando o design que vai além da superfície

O desafio na hora de escolher um designer para entrar para o time acontece justamente na hora de investigar além da superfície do que estå sendo mostrado na tela na hora da entrevista. Os piores candidatos são aqueles que enviam PDFs carregados de imagens belíssimas, mas sem nenhum contexto do problema que estava sendo resolvido ali.

As 4 camadas do design
“Design”, por si sĂł, engloba uma sĂ©rie de camadas que vĂŁo muito alĂ©m do que o usuĂĄrio vĂȘ na tela.

O problema de confiar em plataformas como o Dribbble ou o Behance para mostrar o seu trabalho Ă© correr o risco de deixar de mostrar todo o pensamento que aconteceu atĂ© vocĂȘ chegar aquela solução. E quando falo em “pensamento”, nĂŁo estou falando em decisĂ”es como “40px de espaçamento ou 60px?”, mas sim em informaçÔes mais aprofundadas sobre o problema que os designers precisavam resolver naquele contexto.

AliĂĄs, um experimento mostrou que 75% dos trabalhos publicados no Dribbble focam apenas na Ășltima camada do design, a visual. (fonte)

Seu trabalho pode ser incrĂ­vel, mas se vocĂȘ foca apenas na Ășltima camada na hora de apresentar seu portfolio, pode estar perdendo uma grande oportunidade de se diferenciar dos “designers que sĂł conhecem os pixels”. O quĂŁo fundo vocĂȘ estĂĄ disposto a ir no seu prĂłximo board?

--

--