Mapeando as habilidades de um time de design
Como definimos quais habilidades uma pessoa designer precisa ter para avançar de nível?
É fato, hoje o design contempla muitas áreas de atuação, especializações e competências. Quando entramos de cabeça no assunto ou decidimos migrar para a área, pode ser muito difícil saber para onde ir e quais habilidades desenvolver. Às vezes, temos até aquele frio na barriga com tantas possibilidades. Afinal, devo estudar pesquisa? Design de interação? Arquitetura da informação? Ou técnicas de mediação?
Dependendo da maturidade de design da empresa, as respostas destas perguntas não são tão claras e o caminho torna-se nebuloso. Também fica difícil para a empresa saber se o time está performando bem e o que precisa melhorar para que a frente de design seja mais madura e especializada.
Na Casa Magalhães, o contexto era permeado por estas dúvidas. O setor de UX era relativamente novo e não tínhamos clareza de quais habilidades um designer precisava ter para dar um próximo passo. Além disso, nesta época, como os designers eram avaliados era bem rudimentar.
Hoje, o time de Casa Magalhães faz parte do Grupo Boticário e temos um sistema de leveling e avaliação bem mais maduro.
Bom, mas como resolvemos o problema na época? Vou contar como foi esse desafio.
Passo 01: iniciando as pesquisas
Antes de levar a ideia ao time, investi algum tempo entendendo como outras empresas nivelavam designers e como o mercado dividia as especializações. Cheguei a alguns materiais interessantes, um deles dava uma ideia do espectro do UX Design.
É interessante observar que podemos diferenciar as atuações conforme a nomenclatura do cargo: Product Designer deve ter mais skills de estratégia e interface; UI/UX Designer tem mais skill em interface, mas também deve ter bons conhecimentos em pesquisa e o mínimo de estratégia. Cá entre nós, uma boa equipe de design deve ter bastante conhecimento do negócio, afinal, se olharmos somente para a necessidade da pessoa usuária, podemos deixar a necessidade da empresa de lado e a solução pode não ser sustentável.
Naquela época, a pessoa designer ainda era vista somente como “fazedora de tela”. Como contornar isso? Aproximando designers do negócio.
Com base nisso entendemos que nosso time precisava desenvolver mais skills relacionadas a negócio, então definimos três macrocampos para criar nossa árvore de habilidades: Estratégia, UX e UI.
Passo 02: dinâmica com o time
Para entender melhor a visão do time a respeito do que eles entendiam como habilidades em cada um dos campos escolhidos, fizemos um processo bem colaborativo.
Iniciamos nossa primeira sessão dando um tempo para cada pessoa colocar em post-its as habilidades que acreditava que deveriam estar em estratégia, UX ou UI.
Depois, por uma discussão aberta, escolhemos quais faziam mais sentido para o nosso mapa de habilidades.
Passo 03: definição das habilidades
Somando as pesquisas, conversas individuais e a dinâmica, chegamos a um resultado muito bacana. É interessante ressaltar que no momento em que estávamos, no qual a pessoa designer era basicamente uma fazedora de telas, nós sabíamos que era preciso estar mais próximo da estratégia do produto para contornar isso, então conferimos mais peso ao campo de estratégia.
Ficou assim:
Estratégia
- Entendimento do negócio: ser designer é também contribuir com a estratégia do produto. Para isso, precisamos de visão e entendimento do negócio. Design é estratégico.
- Análise da concorrência: precisamos conseguir fazer benchmarking para entender pontos fortes e oportunidades em outros players do mercado.
- Métricas: medir resultados e ser data-driven é importante para nossa tomada de decisão.
- Colaboração e facilitação: conseguirmos propor, conduzir e participar de momentos de colaboração é fundamental para construirmos produtos mais assertivos.
- Comunicação: soft skill relevante para nós, que a todo momento precisamos articular e negociar efetivamente.
- Autonomia e liderança de projetos: liberdade para a pessoa designer atuar no produto com pouca necessidade de supervisão.
UX Design
- Pesquisa com o usuário: a resolução dos problemas das pessoas usuárias é feita, principalmente por entrevistas, grupos focais, testes de usabilidade, etc. Como nosso perfil era de Product Designers, nossa prioridade não era dominar todos os tipos de pesquisas, mas termos uma boa noção sobre como e quando usá-las.
- Arquitetura da informação: pensar em hierarquia, fluxos, estrutura e organização do produto antes de iniciar um trabalho de prototipação é fundamental para garantirmos uma entrega de qualidade.
- Conhecimento em frameworks de design: ter um pool de ferramentas e também entender quando e como utilizá-las no dia a dia de trabalho.
- Design de interação: muito mais do que desenhar telas, aqui falamos sobre o uso consistente do nosso design system, de design de micro-interações, handoff ao time de desenvolvimento e aplicação dos nossos princípios de design.
Passo 04: níveis e critérios
Após definirmos nossas habilidades, criamos os níveis e critérios para cada skill:
- Novato: tem entendimento básico sobre a competência.
- Iniciante: demonstra a competência sob supervisão.
- Competente: demonstra a competência independentemente.
- Proficiente: supervisiona outras pessoas na competência.
- Expert: desenvolve novos meios de aplicar a competência e também é referência para o time.
Passo 5: avaliando o time
Depois de todo o processo de ideação, desenvolvimento e validação do mapa de habilidades, foi a hora de aplicarmos na prática. O objetivo não era ter um documento escrito, no qual o time se colocasse em caixas, mas fazê-los terem uma reflexão do que seria necessário desenvolver para se tornar uma pessoa designer mais proficiente.
Então, dividimos essa etapa em três: autoavaliação, avaliação dos pares e feedback.
Autoavaliação
Através de um formulário, a pessoa designer autoavaliou cada competência, com base nos critérios que foram definidos.
Avaliação dos pares
Tive um papo rápido com cada designer para identificar outros designers com quem a pessoa interagiu, para que a avaliação tivesse evidências baseadas no trabalho em conjunto.
Após isso, cada designer avaliou a pessoa indicada da mesma forma que fez na sua autoavaliação.
Feedback
Bom, para fecharmos todo esse ciclo, demos o esperado feedback com o resumo da autoavaliação e da avaliação dos pares, bem como um apanhado de pontos fortes e oportunidades de melhoria coletados.
E para facilitar a visualização dos resultados, criei um canvas que trazia todas as avaliações dos pares da pessoa designer e a sua autoavaliação.
No exemplo do canvas acima, os pontos mais escuros são as notas que o designer se deu e as mais claras dizem como o time enxerga aquele profissional. Isso é bem bacana de mostrar, pois muitas vezes somos duros com nós mesmos, enquanto outras pessoas nos veem como referência ou ótimos em determinado assunto. Trazer essa perspectiva é muito rico para um momento de feedback.
Nesse momento, fizemos também uma calibração do nível que a pessoa designer se encontra, baseado na sua autoavaliação, na avaliação dos pares e na matriz de habilidades que criamos e que usamos como referência.
Após a calibração, conseguimos criar um gráfico que comparava a pessoa designer com a média do time, uma ótima forma de termos uma visão mais macro para a criação de um plano de desenvolvimento individual.
Concluindo
Mais importante do que criar um sistema de nivelamento e classificar as pessoas designers do time, é dar continuidade ao processo. Construa um PDI (Plano de Desenvolvimento Individual) com seu time com base em todos os feedbacks coletados, e estabeleça uma rotina de acompanhamento das ações mapeadas para o desenvolvimento do seu time.
Talvez o seu primeiro modelo não saia da forma ideal, o importante é ir testando e incrementando o processo a cada ciclo de avaliações. Vale testar a periodicidade e sempre documentar, para se criar um histórico. Assim é possível ver a evolução individual das pessoas, designers e entender as fortalezas e fraquezas do time como um todo.
E caso você esteja à frente de um time em uma empresa que não tenha uma alta maturidade de design, vale apresentar os resultados e todos os insights que você coletou para as lideranças que têm contato com a área. Assim você incentiva o desenvolvimento do time e deixa claro para todos onde seu time está e o caminho ideal a seguir.
Boa sorte!