Pesquisa com usuários: como escolher a técnica certa?
Bom, você já está convencido de que é importante e vale a pena fazer pesquisa com usuários. Se não está, volte duas casas ao post anterior.
O próximo passo é: escolher o tipo de pesquisa mais adequado para cada contexto e para cada pergunta a ser respondida.
Mas para que serve cada técnica? O diagrama abaixo pode ajudar:

Diagrama criado para o curso de teste de usabilidade, com base no artigo de Christian Rohrer (2008), com as práticas mais comuns em nosso mercado. Repare: não é exaustivo e pode ser que faltem alguns tipos de pesquisa aí. E note que algumas bolinhas nem são pesquisa propriamente dita, como “Google Analytics”, mas na prática são formas de obter informações sobre usuários e podem ser utilizados no mesmo contexto.
Bom, a primeira coisa sobre este diagrama é um pouco óbvia, mas importante: são dois eixos.

Eixo horizontal: qualitativo ou quantitativo?
“Essa é fácil! Qualitativo é com pouca gente, quantitativo é com uma boa quantidade de gente!”
SIM! As amostras são bem diferentes e o tempo dedicado a cada participante é bem diferente. Mas não é só isso.
Em uma abordagem qualitativa, geralmente você tem contato direto com a pessoa e está interessado em saber como a pessoa utiliza um produto e por que o utiliza dessa forma. A sua intenção é identificar diferentes comportamentos, opiniões e atitudes sobre o produto.
Em uma abordagem quantitativa a intenção é medir quantas pessoas acham isso ou fazem aquilo e quantificar comportamentos mais comuns dentro de um universo de pessoas.
A decisão entre uma abordagem e outra tem a ver com o que você quer descobrir. Um truque é prestar atenção no tipo de pergunta. Se você quer saber “por que” ou “como”, geralmente o melhor é uma qualitativa. Se quer descobrir “quantos”, o próprio nome já diz: é quantitativa.
E como cada abordagem responde perguntas diferentes, você pode (e deve, sempre que possível!) combinar as duas, como:
- Descobri no analytics (quantitativo) que muita gente sai do fluxo de compra na etapa de cadastro. Vou investigar por que fazem isso com testes de usabilidade (qualitativo).
- Fiz várias entrevistas com clientes e descobri vários comportamentos diferentes em relação a compra de sapatos online. Para saber quais são os mais frequentes, vou fazer um questionário online.
“Mas a partir de quantas pessoas passa a ser quantitativa?”
UPDATE:
Olha, essa pergunta nem é a mais correta para este caso. Não é como se você começasse fazendo um teste com 10 pessoas e, quando chega no vigésimo participante, virou quanti. Na verdade, é uma forma diferente de realizar a pesquisa. E é possível usar métricas quantitativas e rigor estatístico mesmo em amostras pequenas — se quiser saber mais, quem fala bastante sobre isso é o Jeff Sauro (notório pelo trabalho e pelo sobrenome mais divertido de todos os tempos). ;)
Mas qual deve ser o tamanho da amostra para ter bons resultados? Parece bobo responder assim, mas é verdade: depende.
Depende do tamanho do seu universo de usuários e do nível de confiança que você precisa ter nos resultados, depende da margem de erro com a qual você pode trabalhar. Sabe aquele lance de 2 pontos para cima e 2 pontos para baixo de que o William Bonner comenta no Jornal Nacional na hora de anunciar resultados de pesquisa Ibope? Então. Mas para dar uma ideia: uma amostra de pesquisa quanti pode ser de 300 ou de 2000 participantes. Mas dificilmente será de 5. ;)
Se você, como eu, não entende quase nada não é especialista em estatística, procure no Google por “calculadora de amostra” (sample size calculator) e peça ajuda para quem entende.

Eixo vertical: o que as pessoas dizem vs. o que as pessoas fazem
Olha, eu acho que o título já explicou tudo.
Pode haver uma boa diferença entre o que as pessoas fazem e o que dizem que fazem. Por exemplo: quando eu peço receita de bolo para a minha avó, ela me explica em praticamente 140 caracteres.
“Minha filha, você bate os ovos, depois coloca manteiga, leite, farinha e o resto. E põe no forno até ficar bom.”
O que não ajuda muito, certo? Minha vó faz bolo há pelo menos 60 anos e nem pensa mais no que está fazendo. Para ela, “fazer bolo” é uma atividade automática, no nível comportamental. Melhor ficar de olho nela cozinhando do que tentar seguir essa receita.
Em resumo: se você quer saber como as pessoas utilizam o seu produto, busque as técnicas do lado de cima do gráfico. Se quer saber a opinião que as pessoas têm sobre o seu produto, busque o lado de baixo.

Cores das bolinhas
Você notou as cores diferentes? Não foi só para ficar bonito.
Calma, que eu colo o diagrama de novo aqui embaixo para você lembrar.

As bolinhas azuis, meio esverdeadas indicam uso natural do produto: são técnicas em que a pessoa utiliza o produto de forma mais natural, real, considerando o contexto de uso (computador, casa da pessoa) e o que ela faria normalmente.
Teste de usabilidade em laboratório está em vermelho porque propõe um uso do produto seguindo um roteiro de tarefas, mais simulado. É claro que o seu roteiro de tarefas pode ser baseado em situações reais, mas o ambiente e a situação de teste influenciam nos resultados, não tem jeito. Um teste remoto com tarefas também pode se encaixar nesta categoria, privilegiando um comportamento mais natural, logo…
Vermelho + azul = bolinhas roxas: é um misto de comportamento natural com seguir um script.
Por fim, as amarelas: técnicas em que a pessoa não usa o produto, mas geralmente fala sobre ele. São atitudinais, porque não tem muito como você observar o comportamento da pessoa se ela não estiver usando o seu bendito produto. Card sorting cai aqui, porque não tem contato com o produto, mas com a arquitetura de informação do produto.
UFA. Falamos de tudo. Nos próximos posts vamos explorar algumas técnicas específicas. ;)
Referências / Para ler mais
- When to use which user experience research methods, Christian Rohrer @ Nielsen Norman Group
- User research basics @ Usability.gov
- New Formula for Quantitative UX Decision Making, Jeff Sauro @ UX Mag