Qual a diferença entre insight e ideia? (e por que saber disso pode contribuir no design de um produto)

André Grilo, Ph.D.
UX Collective 🇧🇷
7 min readJan 28, 2018

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Este é um artigo sobre criatividade e estratégia em processos de design.

O mercado digital está repleto de termos e conceitos que ao longo dos anos vêm se popularizando. Na área de design, cada vez mais presente nas organizações, isso tem ocorrido de forma crescente.

Em processos criativos no design de produtos, os termos insight e ideia ocasionalmente são usados como sinônimos, embora sejam conceitos diferentes.

Entender a diferença entre insight e ideia não se trata apenas de uma questão semântica: esse conhecimento auxilia o modo como enxergamos e vivenciamos o processo de design e ideação de um produto.

O design na estratégia de produtos

Em design, processos e decisões andam juntos:

— Processos, porque além da inerente visão de projeto, designers precisam visualizar como o desenvolvimento de um produto percorrerá as diferentes áreas funcionais da organização, com suas respectivas etapas e pessoas envolvidas. Design não é apenas sobre usuários, mas sobre o conjunto de partes envolvidas para entregar valor a esses usuários.

— Decisões, porque todo artefato de design precisa carregar intencionalidade e produzir sentido (Pignatari, 2002; Niemeyer, 2003), o que requer escolhas sobre a tecnologia a ser adotada, a linguagem visual¹ da interface, o esquema de interações e arranjo informacional, dentre outros aspectos que envolverão a experiência do usuário.

Figura 1: Design é uma atividade estratégica no desenvolvimento de produtos, que envolve tomadas de decisão e conhecimento dos processos organizacionais. (Foto: Pexels)

Todas essas definições precisam de parâmetros estratégicos para que sejam consideradas satisfatórias quanto à finalidade de um produto. É por isso que

as boas ideias de design não surgem ao acaso.

Além disso, curiosamente muitas soluções criativas de design costumam ser ideias simples. De tão surpreendentes, costumamos dizer que foi um grande sacada — ou um grande “insight”.

De fato, insights ajudam a construir as boas ideias. Mas não são a ideia em si.

Processo criativo

Em um processo criativo, ocorrem vários inputs de dados, em estágios de consciência e subconsciência. O psicólogo britânico Graham Wallas (1858–1932) costuma ser lembrado por propor, no início do séc. XX, as clássicas etapas² do processo criativo, até hoje difundidas, aprimoradas e debatidas entre especialistas³ (Wallas, 1926):

  • Preparação;
  • Incubação;
  • Iluminação;
  • Verificação.
Figura 2: o processo criativo estimula diferentes zonas mentais e funções intelectivas. (Foto: Pexels)

De um modo geral, a concepção de uma ideia envolve o foco em uma determinada questão e o aprofundamento sobre suas particularidades, gerando acúmulos em um período de incubação. Emergem, posteriormente, as primeiras iluminações (insights) espontâneas sobre o problema, intuições que são verificadas e aprimoradas pelo acionamento de diferentes zonas mentais, até a definição da ideia.

Dessa maneira,

insights não são ideias, mas partes de uma ideia.

Bono (1970) considera que para se obter melhores resultados (ideias) é preciso exercitar o que ele denominou pensamento lateral, que consiste em explorar diferentes perspectivas em direção da solução (Figura 3).

Figura 3: Insights localizados em percurso vertical tendem a reforçar uma mesma possibilidade. Insights encontrados nos desvios laterais diversificam as perspectivas para se chegar à ideia. (Elaborado pelo autor, baseado em Bono, 1970)

A qualidade de uma ideia deriva das diferentes zonas mentais estimuladas ao longo do processo criativo (Torre, 2008). Por isso, designers devem considerar diferentes opiniões e perspectivas, o que maximiza a necessidade de ouvir e compreender o usuário, seu contexto e suas formas de pensar. Essa prática, além de tornar a solução mais criativa, promoverá uma melhor experiência aos usuários por considerar seus modelos mentais.

Ideação

É denominada ideação a fase de um processo de design voltada para geração de soluções (Vianna et al., 2012). Ideação, em outras palavras, é uma etapa objetiva e propositiva, dentro de um método estruturado de design, orientada a geração de ideias para o produto.

Todo processo de design, em seu estágio inicial, tende a ser denso e em profundidade: levantamento de dados, (re)conhecimento do problema, abordagens com usuários, entendimento das estratégias da organização e do produto.

Tal levantamento e transformação de dados em informações atinge níveis de acúmulo e saturação — funcionando como um processo criativo. Quando isso ocorre, começam a se tornar visíveis as oportunidades de design obtidas de uma determinada imersão. Essas oportunidades, no contexto do design, são os insights.

A combinação e síntese de diferentes insights voltados para atender determinados critérios de design para o produto constituirão as ideias.

As ideias são o resultado de uma combinação e síntese de diferentes insights voltados a atender determinados critérios de design para o produto.

Segundo Vianna et al. (2012:67):

Insight: é o achado proveniente da imersão, a identificação de uma oportunidade.
Ideia: é uma solução gerada para atender a um ou mais insights.

Figura 4: Pirâmide de Ideação. (Elaborado pelo autor, baseado em Vianna et al., 2012:67).

Insights funcionam como gatilhos que nos apontam possíveis direções. Não são a ideia propriamente, mas pequenos fragmentos de possibilidades. São úteis também para estabelecer critérios de design (Figura 5).

Figura 5: Insights podem inspirar a definição de critérios de projeto, que servirão de orientação para elaboração das ideias e sua posterior validação. (Elaborado pelo autor)

Validação das ideias

Estabelecer critérios para realizar a ideação é uma prática estratégica, pois serão usados posteriormente para validar as ideias de design. As validações podem ser realizadas utilizando matrizes de critérios (Figura 6).

Figura 6: Matrizes de validação eliminam decisões baseadas apenas em aspectos valorativos e subjetivos. Critérios, além de direcionar a geração de ideias, permitem a sua validação. (Elaborado pelo autor)

Além de matrizes, outro recurso que particularmente considero bastante eficaz é expressar os dados resultantes da validação em um gráfico polar, para visualizar a abrangência em escala de cada ideia em relação aos critérios (Figura 7).

Figura 7: Gráfico polar de validação de ideias por critérios. No exemplo, seja o critério C(n) e seja a escala de validação de 1 a 4, três ideias são validadas de acordo com seu nível de alcance em relação a cinco critérios. (Gráfico ilustrativo; Elaborado pelo autor)

O gráfico facilita a comparação entre as validações do time e dos usuários do produto. Validações necessitam de pontos de vista de ambos os lados, uma vez que

Gerar boas ideias requer pensamento divergente.

Conceber uma ideia é um processo criativo, porém convencer pessoas sobre uma ideia é um processo social (Berzbach, 2013). A ideação de um produto envolve muito mais ouvir e absorver, do que emitir opiniões e erigir a própria maneira de pensar. Deve ser colaborativo. Por isso, exige critérios multilaterais, que abranjam diferentes pontos de vista: do usuário, dos designers, desenvolvedores, patrocinadores e gerentes, dentre outras partes envolvidas. Designers devem estar preparados para descartarem ideias que não se alinhem aos propósitos e critérios estratégicos do projeto.

Somente quando você for capaz de se separar de suas ideias é que haverá lugar para novas. (Berzbach, 2013:14)

Ideias não são para o designer, mas para o usuário.

Reitera-se que qualquer processo de ideação de um produto deve ser focado no usuário. Nesse sentido, designers e times de desenvolvimento devem conduzir o processo de concepção de uma ideia de modo que a variedade de alternativas sejam direcionadas para entregar uma boa experiência ao usuário, atendendo seus objetivos e necessidades.

Considerações finais

São muitos os métodos e abordagens de design praticados no mercado, os quais funcionam de acordo com o contexto de cada organização. É bem-vindo que tenhamos diversidade em nosso modus faciendi, uma vez que organizações também são organismos, formados por pessoas e por diferentes culturas, fatores que influenciam os processos. No entanto, alguns conceitos precisam estar claramente definidos para que designers e times de produto tenham maior entendimento dos processos e das decisões. Dentre eles, o discernimento sobre o que é um insight e o que é uma ideia possibilita maior reflexão e direcionamento para aquilo que é proposto pelo time e a qualidade da experiência a ser proporcionada ao usuário.

Autor

André Grilo de Sousa, M.Sc.
Mestre em Design, com ênfases em interação humano-computador, ergonomia cognitiva e interfaces digitais. Coordenador de Design, Usabilidade e Experiência do Usuário na Superintendência de Informática, divisão de Tecnologia da Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Referências

Berzbach, F. (2013). Psicologia para criativos. São Paulo: Gustavo Gili.
Bono, E. (1970). Lateral thinking: creativity step by step. New York: Harper & Row.
Niemeyer, L. (2003). Elementos de semiótica aplicados ao design. Rio de Janeiro: 2AB.
Pignatari, D. (2002). Informação, linguagem e comunicação. Cotia-SP: Ateliê Editorial.
Torre, S. (2008). Criatividade Aplicada. São Paulo: Madras.
Vianna, M.; Vianna, Y.; Adler, I.; Lucena, B.; Russo, B. (2012). Design Thinking: inovação em negócios. Rio de Janeiro: MJV Press.
Wallas, G. (1926). The Art of Thought. Oxford University.

Notas

¹ O conceito de interface em design é amplo e não apenas relacionado ao visual. Interfaces podem proporcionar experiências também por meio de estímulos sonoros, táteis, dentre outras formas de interação.

² Entende-se que processos criativos não seguem estritamente um único caminho e podem percorrer de maneira não linear. Interessou aqui observar as etapas wallasianas como suporte para compreensão dos momentos chave na geração de uma ideia e suas conexões com o processo de design.

³ O modelo teórico de Wallas foi precursor de outras proposições de diferentes autores, como Wilferd Peterson (“The art of creative thinking”, 1964) e Alex Osborn (que propôs a técnica brainstorming em “Your Creative Power”, 1948), sendo até os dias de hoje mencionado em tópicos sobre criatividade.

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Design, Educação e Cibercultura. Reflexões sobre Design de Produto Digital e Experiência do Usuário.