Teste de Guerrilha: recebendo feedbacks de forma rápida e com baixo custo
Um passo a passo para testar soluções.

O teste de usabilidade é uma excelente maneira para validar soluções com usuários e conseguir um feedback qualitativo sobre o produto. Porém, sabemos que existem alguns impeditivos para a realização dessa abordagem, como: falta de tempo, recursos e infelizmente algumas empresas ainda não possuem maturidade de UX para entender a importância desse processo. Logo, nem sempre teremos as condições ideais para a realização de testes com usuários, então é hora de começarmos a refletir se realmente vale a pena testar apenas em um cenário perfeito.
Sou designer de produto há 8 anos e neste mundo de produto, tudo é muito dinâmico e precisamos de respostas rápidas para a melhoria das funcionalidades. É neste momento que os testes de guerrilha entram como uma maneira alternativa de nos ajudar a conseguir essas respostas de forma ágil e com baixo custo. Estou dizendo que isso substitui os testes de usabilidade tradicionais? De forma alguma, o teste de usabilidade ainda é a melhor maneira para validar soluções com usuários, mas mesmo em um cenário de impossibilidade nunca deixe de testar, o importante é sempre testar independente do cenário.
“Faça o seu melhor, na condição que você tem, enquanto não tem condições melhores para fazer melhor ainda!”
— Mário Sergio Cortella
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O que é?
Assim como outras técnicas de usabilidade, o teste de guerrilha é um processo para avaliar a eficácia da interface, testando seu visual, fluxos, textos e micro-interações com o público-alvo.
A grande diferença do teste de guerrilha é que não existe um recrutamento feito com antecedência. Os participantes são abordados em um local público (cafeterias, shoppings ou na rua) pelos pesquisadores minutos antes do teste, e caso aceitem participar são levados para um local mais reservado para testar a interface. Isso torna este tipo de teste mais barato, rápido e descomplicado.
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Quando utilizar?
O ideal é que os testes sejam utilizados nas etapas iniciais do desenvolvimento da interface, para evitar retrabalho no futuro. Mas isso não está escrito em pedra, na verdade por termos a liberdade de escolher como será o artefato que vamos levar para o teste (um wireframe, uma interface em alta-fidelidade ou um paper prototype) podemos incorporá-lo a qualquer momento do processo de design.
Os testes iniciais ajudam as equipes a validar suas ideias antes que gastem tempo e recursos para desenvolvê-las, e tem se mostrado eficaz em termos de custo a longo prazo.
— Emily Grace
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Como fazer?
Para explicar melhor todas as etapas do processo, usarei exemplos reais do meu atual trabalho. Em resumo, fizemos 12 testes de guerrilha para validar a funcionalidade de solicitar um cartão de débito. Apenas contextualizando, estou trabalhando no desenvolvimento do banco digital da Bemol (a maior varejista do Amazonas) e a solicitação do cartão é uma das funcionalidades mais tradicionais de qualquer banco.
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1. Planejando o teste
Assim como o teste de usabilidade tradicional, é essencial planejarmos como será feita a guerrilha. Porém, neste cenário não é necessário um documento super detalhado com os perfis de recrutamento, budget, premiação, dinâmicas quebra-gelo e aquela série de fatores que listamos em um relatório de planejamento. No contexto de guerrilha, o importante é:
- Deixar claro os seus objetivos, no caso o que você quer testar;
- Levantar as hipóteses para teste;
- Elaborar um mini script para guiar o entrevistador no momento do teste.
Bem mais simples não concorda?
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2. Elaborando o roteiro e protótipo
Alguns profissionais apenas listam em um bloco de notas o que irão elaborar no teste e então "seguem no talento" do entrevistador. Mas se você não está acostumado a fazer entrevistas e quer garantir que nenhum detalhe escape, aconselho elaborar um script sobre os principais pontos que você irá conversar com seu participante, pode ser as perguntas principais, questões estratégicas e observações para não esquecer.

Lembrem-se de evitar perguntas que enviesem respostas e que o contexto é de guerrilha, então nada de desenvolver um script que dure mais de 15 minutos. Quando aprontar seu roteiro, sugiro fazer um teste piloto para validar questões de tempo e se tem algo que precise ser ajustado.
Quanto ao protótipo, a funcionalidade de solicitação de cartão ainda não tinha sido desenvolvida, mas já tínhamos as telas em alta fidelidade. Nesse caso, fizemos um protótipo no próprio Figma e colocamos para rodar no celular. Um detalhe importante é que além da solicitação de cartão também testamos o desbloqueio, vocês devem estar se perguntando como fizemos isso se o cartão leva dias para chegar.
Pois bem, aí vem o pulo do gato, simulamos um cenário em que já tinham se passado alguns dias e o cartão tinha acabado de chegar na casa do cliente, para essa simulação imprimimos um cartão fake 😉.

Afinal, no teste de guerrilha não fazia diferença se era o cartão original ou não, queríamos validar as funcionalidades que estavam na tela do celular, então um cartão impresso que simulava os valores que o cliente precisaria para desbloqueá-lo já era o suficiente para adquirirmos as respostas que precisávamos.
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3. Definindo os perfis e o local
Decidir o que queremos testar é importante, mas de nada adianta se não testarmos com as pessoas adequadas. A definição do público-alvo e o levantamento desses perfis são fatores que influenciam não só na construção de nossas soluções como também na validação delas.
Para nossos testes utilizamos dois perfis:
- Clientes tradicionais, que ainda pagam contas na loteria e ainda não confiam tanto na tecnologia, porém sempre utilizaram bancos. Normalmente são pessoas com mais idade.
- Clientes contemporâneos, confiam na tecnologia e usam o smartphone para resolver todos os seus problemas financeiros, já possuem conta em um banco digital e normalmente são pessoas mais jovens.
Ressalto que todos os participantes dos testes deveriam pertencer a algum desses perfis e ser cliente Bemol. E oh! Esses perfis foram desenvolvidos em uma outra pesquisa que não irei entrar em detalhes aqui.
Decidido nosso público, agora é o momento de pensar onde podemos encontrar essas pessoas. A premissa é que será em um local público (cafeterias, lojas ou shoppings), no nosso caso definimos duas lojas da Bemol: uma na região mais nobre da cidade e outra mais afastada. Foi uma decisão estratégica, pois queríamos observar se haveria e como seria o contraste do público.
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4. É hora de guerrilhar
Agora, com tudo definido, é hora de ir aos locais realizar os testes. Antes de começar é importante observar o ambiente, a movimentação e principalmente definir uma base.

O que estou chamando de base é o local onde o teste será executado, de preferência faça os testes em um local mais reservado e que não seja longe de onde os participantes estão circulando. No nosso caso, conseguimos uma mesa em um dos cantinhos das lojas.
Os testes aconteciam da seguinte forma:
- Observávamos a movimentação dos clientes e o abordávamos, eu me apresentava, falava o objetivo da pesquisa e fazia uma pergunta estratégica para filtrar o perfil. Caso o perfil fosse aderente aos que tínhamos definido era feito um convite, se o cliente topasse o conduzíamos até a base para começar o teste.
- Executávamos o teste na base. Ah! Nós fomos em dupla fazer os testes. Um conduzia a entrevista e o outro anotava tudo.
- Por fim, fazíamos os agradecimentos e entregávamos um brinde.

Rodamos os testes em 2 dias, fizemos 6 testes em cada dia, totalizando 12. Ao final desse processo tínhamos uma coleção de dados para analisar.
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5. Analisando os dados
Para a transcrição, utilizamos a tradicional planilha no excel. Enquanto estávamos executando os testes também anotávamos todas as informações fornecidas pelos clientes já na planilha para agilizar o processo.
Na análise dos dados, eu e meu colega de trabalho (designer talentosíssimo) detectamos que alguns problemas se repetiam, assim, definimos a frequência como um fator determinante para a priorização desses problemas. Outro fator foi a classificação desses problemas de acordo com um grau de severidade definido por Nielsen. Ao final, tínhamos uma planilha com vários problemas priorizados de acordo com sua frequência x grau de severidade.
Não diferente de qualquer pesquisa, ao final da analise geramos um relatório com os resultados obtidos. Na oportunidade, apresentamos para todo o time e em seguida nos reunimos com nosso PM e as partes envolvidas para inserir os itens de melhoria no backlog com sua devida prioridade.
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Dicas finais
- Deixe muito claro o que você quer testar, isso ajudará você a delimitar o escopo da pesquisa
- Prepare um roteiro de teste enxuto, os testes são de guerrilha então não tome muito tempo dos seus participantes
- Para a execução dos testes, o ideal é estar em dupla, onde um poderá moderar e o outro anotar as informações e captar o não-dito
- Evite falar termos técnicos no momento do teste, seus participantes provavelmente serão pessoas leigas no assunto e isso pode acabar intimidando-os
- Peça para que os participantes "pensem em voz alta", isso ajudará você a entender o racional por trás das atitudes dele
- Fale menos e ouça mais, evite interromper os participantes, deixe eles a vontade para dar a opinião deles
- Aborde pessoas que estão ociosas, alguém mexendo no celular ou relaxando. Abordar desconhecidos é um pouco constrangedor, logo no início pode bater o nervosismo, mas depois de fazer isso repetidas vezes a gente pega a manha
- Esteja arrumado adequadamente.
Conclusão
Todo esse processo foi rodado em uma semana e meia e os únicos custos foram a locomoção para o local e os brindes dos participantes. Os testes de guerrilha nos deram agilidade para conseguir resposta de maneira mais rápida e com baixo custo.
Eu reforço, eles não substituem os teste de usabilidade tradicionais porém proporcionam dados mais enxutos que servem como referência para obter respostas. É melhor trabalhar com o que tem a disposição do que não fazer pesquisa nenhuma. Obrigado por ter lido até aqui 💙
Referências
- Teste de Guerrilha: como e quando vale a pena usá-lo?
- Você não precisa de muito tempo e dinheiro para testar sua interface
- Guerrilla Usability Testing: How To Introduce It In Your Next UX Project
- How to do guerrilla testing right
- Airbnb Guerilla Usability Testing
- What is Guerrilla Usability Testing?
- Guerrilla Testing: Hallway Usability Tests for UX
- A Guide to the Art of Guerrilla UX Testing
- A Guerilla Usability Test on Dropbox Photos
- Severity Ratings for Usability Problems
