UX Collective 🇧🇷

Curadoria de artigos de UX, Visual e Product Design.

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Projetando um mundo melhor

Conhecendo cases importantes da prática do design pra uma sociedade melhor.

Gabriel Simões
UX Collective 🇧🇷
7 min read1 day ago

Imagem de crianças em preto e branco com o fundo vermelho. No topo, a frase “A gente vai sobreviver. Sem dúvidas”.
“A gente vai sobreviver. Sem dúvidas”. Emory Douglas.

O design pode transformar o mundo em um lugar melhor. E eu posso provar.

Nesse artigo, quero te apresentar exemplos de pessoas ou iniciativas que trazem na alma a essência do design. Que serviram de apoio pra mudanças significativas — ou que ainda o fazem — na sociedade.

Espero sinceramente que eles te inspirem a ser uma pessoa designer melhor a cada dia, assim como fazem comigo 😊

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Emory Douglas e o partido Panteras Negras

“Retratando a coragem das vítimas de abusos contra os direitos civis e a brutalidade das autoridades contra elas, as imagens de Douglas foram publicadas no jornal dos Panteras Negras e em cartazes colados ao redor da sede do partido em Oakland, Califórnia.

Seu estilo gráfico marcante, com contornos ousados e cores vibrantes em imagens brutalmente impactantes ou comoventes, criou uma identidade visual instantaneamente reconhecível para o movimento.”

— Alice Rawsthorn.

Quero falar de uma das pessoas que usaram o design como ferramenta pra combater e lutar contra a repressão policial dos Estados Unidos ao povo negro: Emory Douglas.

Entre 1967 e 1980, ele foi o ministro da Cultura do Partido dos Panteras Negras. Como ativista e designer, representava graficamente a resistência do grupo e as opressões sofridas pelas comunidades negras estadunidenses.

O movimento é referência até hoje quando o assunto é comunicação visual e design gráfico. E Douglas foi uma das pessoas responsáveis por criar toda a identidade visual do partido, além de contribuir ativamente, através de seus cartazes, em denúncias a prisões injustas e abusos de autoridade por parte do Estado.

Inclusive, foi um desenho dele que popularizou a relação entre o termo “porco” ao policiamento abusivo e ostensivo. Essa imagem foi descrita assim, nas palavras de Alice Rawsthorn:

“‘O que é um porco?’ está escrito acima de uma imagem grotesca de um porco mancando com a ajuda de uma muleta, lágrimas escorrendo do focinho, roupas rasgadas, membros enfaixados e mosquitos zumbindo em suas feridas.

A resposta à pergunta está logo abaixo: ‘Uma criatura de natureza vil, sem respeito pela lei, justiça ou direitos das pessoas; um ser que morde a mão que o alimenta; um difamador imundo e depravado, que costuma se passar pela vítima de um ataque injustificado.’”

A imagem? Essa aqui:

“‘O que é um porco?’ está escrito acima de uma imagem grotesca de um porco mancando com a ajuda de uma muleta, lágrimas escorrendo do focinho, roupas rasgadas, membros enfaixados e mosquitos zumbindo em suas feridas. A resposta à pergunta está logo abaixo: ‘Uma criatura de natureza vil, sem respeito pela lei, justiça ou direitos das pessoas; um ser que morde a mão que o alimenta; um difamador imundo e depravado, que costuma se passar pela vítima de um ataque injustificado.’”
“Battle Fatigue”, de Emory Douglas. The Black Panther Newspaper, 1969.

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Oficina de Transformação de Pedra Furada

“Tendo como ponto de partida os conceitos de reciclagem local de plástico e de design para a inovação social, desenvolvemos tecnologia e metodologia apropriadas para que pessoas comuns, sem formação técnica, possam produzir objetos de valor comercial, gerando trabalho e renda.

O teste em campo dessa tecnologia foi realizado com a criação da Oficina de Transformação de Pedra Furada, em Sergipe, empreendimento no qual jovens artesãs fabricam e comercializam móveis, a partir de resíduo plástico coletado no lixo.”

Gomes e Souza.

Agora, viajamos dos EUA ao Brasil. Mais especificamente, Sergipe.

Paulo Gomes e Paulo Souza, os autores do projeto, contam que a ideia principal é unir duas dores da sociedade, uma ambiental e outra social: a reciclagem e a pobreza.

Pra isso, criaram um modelo conceitual do que chamaram de Oficina de Transformação (OT), composto por:

  • Armazenamento e seleção do plástico
  • Lavagem e trituração do plástico
  • Operação dos equipamentos de reciclagem e armazenamento das placas e barras
  • Produção de objetos de valor, e
  • Atividades administrativas e organização.

O teste prático desse processo aconteceu no povoado de Pedra Furada, em que 74% da população vive com até um salário mínimo e a fonte de renda principal é a coleta de aratu, um caranguejo pequeno que vive no mangue da região.

As mulheres que participaram do projeto foram ensinadas a trabalhar com o maquinário — ainda simples, diga-se de passagem — e a produzir peças como mesinhas de centro, cadeiras e até carteiras de escola pra um projeto social da região a partir do material reciclado.

Se o projeto deu certo? Deixo a resposta para os autores: hoje, a tecnologia social desenvolvida se encontra madura o suficiente para ser escalada. Já garantimos financiamento para a implantação de três oficinas de transformação na região metropolitana de Salvador, Bahia, e muitas outras virão.

Vida longa ao design social!

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Movimento Design Ativista

“O Design Ativista desafia a visão convencional do design como uma ferramenta comercial, propondo uma abordagem mais ampla e socialmente engajada.

Desde sua fundação, em 2018, a iniciativa busca levar o design para além dos espaços tradicionalmente orientados ao lucro, transformando-o em instrumento de mudanças culturais, políticas e sociais.”

Design ativista.

Ainda estamos no Brasil. Mas agora, em escala nacional.

Esse projeto traz no nome pra quê veio: usar o design como ferramenta de mudança social. Ativamente presente na sociedade.

Inclusive, vale dizer também que o Design Ativista faz parte da NINJA, uma rede de comunicação livre que busca novas formas de produção e distribuição de informação a partir da tecnologia e de uma lógica colaborativa de trabalho.

Eu, particularmente, me amarro em acompanhar as campanhas feitas em épocas simbólicas, como:

Imagem de um policial militar da época da ditadura brasileira correndo. Ao fundo, a cor vermelha com o texto “ditadura nunca mais”
“Ditadura nunca mais”. Design ativista.

No meio de tanta individualidade e competição, o movimento é um sopro de coletividade pra quem também enxerga o design como ferramenta de mudança social.

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A Grande Muralha Verde

“Para o bem e para o mal, o caso da Grande Muralha Verde exemplifica o tipo de obstáculos e oportunidades que o design enfrenta ao lidar com um dos desafios da nossa época: as mudanças climáticas.”

— Alice Rawsthorn.

Do Brasil pra mãe África.

Ah, e já aviso: esse é um case complexo. Politicamente complexo.

A Grande Muralha Verde é um projeto gigantesco que tá mudando a paisagem da África e a vida de milhões de pessoas. Ou pelo menos deveria. Foi criado em 2007 pela União Africana, e a ideia é restaurar terras degradadas no Sahel, uma região que sofre com a desertificação.

Com 8.000 km de extensão, atravessa 22 países e envolve comunidades locais, governos e parceiros internacionais.

O problema é que, por envolver tantos interesses diferentes, as coisas ficam meio caóticas quando passamos da teoria pra prática.

Pra ajudar a gente a entender melhor esse desafio do ponto de vista do design , vou trazer referências da Alice Rawsthorn, em seu livro “Design como atitude”, da editora UBU.

Ela comenta sobre 4 motivos que fazem esse case ser desafiador e importante pra consolidar nossa disciplina como ferramenta de mudança global.

  1. Representatividade: o projeto, por suas dimensões, corporifica a determinação crescente de utilizar o design pra fazer frente a grandes ameaças globais.
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  2. Interseccionalidade de fatores: nesse caso, não dá pra separar essa iniciativa de recuperação de terras — que se propõe a enfrentar um problema ambiental — das tensões sociais, políticas e econômicas dos países-membros. A Etiópia, por exemplo, conseguiu a maior taxa de reflorestamento até sua guerra civil de 2020. Triste, mas necessário considerar.
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  3. Adaptabilidade: uma vez que a Muralha Verde evolui gradativamente, o design deve ser ágil e flexível ao definir os objetivos norteadores do projeto — e adaptar quando necessário. Vale lembrar que esse é um esforço conjunto de economistas, agricultores, ambientalistas, políticos e especialistas de outras áreas. Quantas variáveis temos aqui, não?
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  4. Personalização: por se tratar de uma área muito extensa, o projeto precisa pensar também localmente. Árvores adaptadas pra regiões específicas são priorizadas, conforme o que é melhor pra natureza. Além disso, cada país tem a liberdade de aplicar técnicas de irrigação e cultivo característicos da sua região e cultura. Ao mesmo tempo que é um direito básico, é incrível ver isso sendo considerado nos dias de hoje.
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O fato é: o projeto ainda tá em expansão e, entre trancos e barrancos, aos poucos vai mudando a vida das pessoas — ainda localmente, mas espero que em breve globalmente também.

E aí, deu pra refletir sobre as tantas possibilidades que a gente, ao fazer design, tem de impactar algo no mundo? Aliás, quero que esse tipo de artigo seja mais recorrente aqui.

Mas, pra isso, preciso da sua ajuda: você conhece algum case de design que mudou ou que tá ajudando a mudar o modo como vivemos em sociedade?

Se sim, me conta comentando aqui ou me chama! 😁

Aquele abraço!

Written by Gabriel Simões

Engenheiro e designer. Pós-graduado em UX. Falo sobre design e sociedade na UX Collective e sobre design conversacional na Bots Brasil.

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